terça-feira, 28 de agosto de 2012

Poemas do Viandante (341)

341. NÃO A MORTE MAS O ECLIPSE DE DEUS, DISSE

Não a morte mas o eclipse de Deus, disse
outro filósofo, e eu fiquei por terra
a tremer de pavor pelo astro grandioso
que, no seu fluir momentâneo, ocultou
o Sol maior que todos os sóis,
e deixa apenas vir uma penumbra de granito
tecida de voraz esquecimento.

É como se entre a tua luz e o meu coração
se erguesse densa parede
e a pedra branca de calcário me roubasse
os teus olhos e a promessa que em ti havia
no deslizar das ancas
ou na fértil  flutuação dos seios…
e nada mais restasse, apenas a súbita descrença
no sabor da boca, da minha se perdia.

Tornemo-nos, nesta meia-luz, crianças
e levedados na palavra escutada
procuremos nos quartos e no jardim,
subamos ao sótão,
espreitemos entre cortinas e veludos.
O que procuram? – ouviremos.
Como no fugaz jogo da infância, dirás:
Um hálito, o leve tremor do soalho, a poalha
suspensa na atmosfera, a sombra de um insecto,
o rasto das horas que passam na tarde de verão.

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