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terça-feira, 31 de maio de 2016

Portas e metáforas

Pierre Bonnard - La Porte Ouverte (1910)

A porta aberta funciona muitas vezes, fundamentalmente, na linguagem corrente, como uma metáfora. Esta contaminação pela linguagem quotidiana roubou-lhe o brilho metafórico. No entanto, a expressão continua a ser essencial para compreender a própria metáfora. Esta é interpretada, por norma, na base da analogia. Se dissermos, porém, que a metáfora é uma porta aberta, talvez estejamos mais perto de perceber o que nela se joga. Semeadas no texto, as metáforas são portas por onde entramos num outro mundo, num mundo que a literalidade esconde ao espírito mas que este, através, dos ardis da imaginação abre, para que neles possamos encontrar o nosso lugar.

quinta-feira, 4 de fevereiro de 2016

Nuvens

Edward Weston - Clouds (1936)

As nuvens possuem a particularidade de unir nelas um conjunto de contrários. Umas sugerem um ambiente pesado; outras, a leveza. Umas tornam o horizonte escuro; outras trazem com elas a claridade. Umas são sentidas como ameaçadoras; outras, benfazejas. O que nunca pensamos é que elas são a imagem, a nossa imagem, que o céu nos devolve. Ao olharmos as nuvens, através das metáforas usadas no jogo pueril da sua classificação, é a nós mesmos que encontramos.

domingo, 28 de setembro de 2014

Metáforas, metáforas

JCM - Time on space (2006)

Devo a Joseph Campbell a visão de que os enunciados fundamentais das religiões - os mitos - são enunciados metafóricos. E todo o equívoco dos não crentes bem como o de muitos crentes é tomarem essas enunciações como referências materiais, enunciados históricos. Ora não o são. Eles dirigem-se a uma outra ordem de realidade que não a mera facticidade. As metáforas condensadas nos mitos são guias para a aventura espiritual, traçam estranhos sinais na pedra onde aquele que se entrega à viagem poderá encontrar, perante a multiplicidade de vias, uma indicação do caminho a seguir. É para isso que servem as metáforas e não tanto para redescrever a realidade.

quinta-feira, 15 de maio de 2014

De espaço em espaço

Jacinta Gil Roncalés - Hacia otros espacios (1991)

A viagem é sempre o caminhar por outros e para outros espaços. Mas se ficarmos presos ao truísmo, não compreenderemos nunca que viagem e vida nada têm de diferente. Para nos afastarmos da banalidade, o melhor será pensar o espaço como uma metáfora, a qual nos abre para uma outra compreensão dessa viagem. Cada novo espaço significa uma nova forma de experimentar o mundo e de ser. Com a transformação dos espaços é o viajante que se torna outro.

sexta-feira, 18 de outubro de 2013

A rosa sem porquê

Agnes Martin - A Rosa (1964)

Die Rose ist ohne warum.
(A rosa é sem porquê.)
Angelus Silesius, CW I. 289

Lê-se o verso de Silesius (o hemistíquo) A rosa é sem porquê e fica-se fascinado. A tentação é de ver um artifício poético, talvez uma aproximação metafórica à sem razão da beleza. Mas devemos ler literalmente o que lá está. É a leitura literal que nos assusta. No verso diz que o porquê ou a razão não fazem parte do ser da rosa. O assustador está na emergência desumanizada da rosa. A razão e os porquês são a presença humana, do entendimento humano, nas coisas, uma forma de as submeter ao nosso espírito e integrá-las numa cadeia de explicações. Mas tudo isso, apesar de nos tranquilizar - pois dar uma razão tranquiliza-nos -, é estranho à rosa. A rosa é sem porquê é uma injunção a estar perto da rosa sem projectar nela os meus temores e, por isso, a minha racionalização. Estou perante aquilo que não posso explicar, que não tem explicação, que se perfila, na sua simplicidade de ser rosa, como um mistério para o qual a minha pobre razão não tem chave. A rosa sem porquê solicita a mais extrema pobreza de espírito.

sexta-feira, 5 de julho de 2013

O jockey enquanto figura

Toulouse-Lautrec - The Jockey (1899)

Olhamos o quadro de Toulouse-Lautrec e corremos o risco de nos deixarmos arrastar pelo hábito e pelas ilusões que este introduz no nosso julgamento. A ilusão está em centrarmo-nos no carácter desportivo e competitivo representado, a corrida de cavalos e as apostas. O jockey pode, todavia, ser olhado como uma figura metafísica, como uma metáfora do viandante. Não é a competição que está em jogo, mas a harmonização entre o homem e o cavalo, entre razão e natureza, entre aquele que peregrina e o veículo da peregrinação. Não se trata de dominar o cavalo, de lhe impor um caminho, mas de se fundir com ele, durante a viagem, de serem apenas um. Como se, pela arte de cavalgar, a separação que cinde o homem em dois fosse cerzida e, naqueles instantes, o homem tivesse um vislumbre da sua verdadeira natureza.