são frívolos
os dias que nos cabem
a herança de
antepassados dadivosos e cruéis
que raptaram
para si a terra rude
e deixaram à
descendência o musgo suave
terras de
seda e planícies de algodão
malévolos
antepassados que tanto nos amaram
e esse amor
esgotou a nossa energia
a velha sabedoria
da terra
o rumor dos
passos na sombra da cidade
ontem estive
nas praias da normandia
e vi as
crateras abertas nos campos de batalha
o ferro
retorcido e o cimento esfacelado
estive em
omaha e utah em sword e pointe de hoc
e chorei por
aqueles que desembarcaram na morte
mas também por
quem a recebeu dos ares
chorei por
amigos e inimigos
e pela
crueldade da vida que mandou morrer
gente mais
nova que os meus filhos
eram duros
os nossos antepassados
vieram num
tempo que pedia a flor da virilidade
e como
recompensa a cruz da morte
o sepulcro
em terra distante e estrangeira
ontem estive
nos cemitérios da normandia
fui a colleville-sur-mer e não esqueci la cambe
e não tinha
flores para deixar em cada campa
nem uma
palavra para dizer
ou a breve
oração que conforta almas perdidas
o uivo da
vida é agora suave ronronar
os tempos
mudaram e tudo é incerto
as amplas
avenidas tomaram o lugar da ruela
e erguem-se
cidades nos campos de batalha
enriqueceram
os homens e as casas cresceram
mas a
estirpe definha atada ao prazer da hora
ao sussurro
dos mercadores no átrio do templo
para que
nascemos nós nesta terra
se já não
sabemos domar o vento do norte
ou com a
força da mão parar a tempestade
ontem estive
na normandia
e toda a
minha vida é uma canção frívola
cantada por
um cantor de cabaret
em cada
campa havia uma acusação silenciosa
e um juiz
erguia-se nas trincheiras desfeitas
para me
condenar à vida fácil
e à
liberdade inconsciente que esconde a morte
o amor dos
antepassados é uma maldição
roubou-nos o
outono e o inverno
levou com
ele a escarpa e o deserto
e encheu a
alma de sonhos de néon e alumínio
construídos
sobre os cemitérios invisíveis
com que o
rude amor nos abriu as portas
para
entrarmos pervertidos no degredo do paraíso
«Ontem estive nas praias da normandia»...quero este poema publicado, já!Já! Já! O título dessa recolha de poemas deste ciclo poderia ser esse: « ontem estive nas praias da normandia»...
ResponderEliminarValeu a pena vir «aqui» hoje (vale quase semore) ! Bravo!
Muito obrigado, Maria.
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