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segunda-feira, 2 de maio de 2016

Do caminho e da viagem

Gonzalo Torné - Camino infinito II (1997)

A viagem que cabe a cada homem parece finita, mas o caminho é sem fim. A natureza infinita do caminho pode significar que este é tão amplo que suporta todas as viagens finitas do homem. Pode ser sinal, porém, de outra coisa: tal como o caminho é infinito, também a viagem que cabe a cada um não tem fim.

segunda-feira, 1 de dezembro de 2014

A finitude e o infinito

Jacinta Gil Roncalés - Búsqueda del infinito (1991)

Perdido no turbilhão da vida, o viandante faz da sua finitude o caminho, o mais improvável dos caminhos, para encontrar nos limites de si mesmo o infinito que por ele chama.

segunda-feira, 4 de agosto de 2014

Por que duvidaste?

Norman Narotzky - All life is there (1984)

E logo Jesus, estendendo a mão, segurou-o, e disse-lhe: Homem de pouca fé, por que duvidaste? (Mateus 14:31)

Esta pergunta - por que duvidaste? - fica sem resposta. Pedro não disse nada. Este silêncio, porém, é eloquente e dá que pensar. Situa-se no encontro conflitual entre fé e dúvida. Qual o significado do silêncio de Pedro? A finitude da sua humanidade indica que esse conflito é constitutivo do homem. Enquanto ser natural dotado de razão, o homem está cindido entre a crença absoluta e a dúvida. Pedro não respondeu pois a sua natureza era a resposta. Duvidar faz parte da condição humana. Para que apenas a fé mais pura brilhasse, seria necessário que Pedro, sendo humano, fosse mais do que um homem. E foi isto o que, por várias vezes e em diferentes circunstâncias, lhe foi pedido.

segunda-feira, 21 de julho de 2014

Perder-se no infinito

Lennart Olson - Cangas de Onis III (1991)

Onde vão dar os caminhos que levam a lado nenhum? Esse nenhures é, em primeiro lugar, o sinal da finitude do viandante. Seja qual for o sítio onde se encontre ou para onde se dirija, devido à sua finitude, o viandante está ou estará em lado nenhum. Esta é, porém, uma visão nascida da fragilidade de um ser finito. Nenhures é, na verdade, o signo do infinito, daquilo que não tem fim. Toda a viagem tem como finalidade que o ser finito se perca no não finito, no infinito que, sem limites, o aguarda.

quinta-feira, 3 de julho de 2014

Passagem para o infinito

Jacqueline Mirsadeghi - Passages vers l’infini

Haverá uma passagem para o infinito? A resposta terá de ser sempre ambígua, um sim e um não. Sim, porque qualquer ponto pode funcionar como passagem para o infinito. Não, porque o infinito está já presente em qualquer ponto. A finitude não é outra coisa senão a manifestação do infinito perante os olhos de seres finitos que transportam em si o infinito.

terça-feira, 8 de abril de 2014

O desejo infinito

Joshua Benoliel - Bairro Grandella (Festas dos Santos Populares) - Estrada de Benfica - Lisboa (início do séc. XX)

Há sempre nas festividades humanas, por faustosas que sejam, um rasto de desilusão, como se o prazer e a alegria esperados fossem outros e não aqueles que estão prometidos e são proporcionados. A incomensurabilidade entre o desejo humano e as suas possibilidades de realização é, na verdade, infinita, pois se a festa, aquilo que é o fruto mais raro da vida material, é finita, o nosso desejo é infinito e só no infinito pode ser saciado.

domingo, 2 de março de 2014

Do finito e do infinito

Jacinta Gil Roncalés - Busca do infinito (1991)

A marca mais manifesta da nossa finitude é a natureza insaciável do desejo humano. Essa insaciabilidade, porém, não nos mostra apenas a nossa limitação e finitude. Torna manifesto, ao sentimento e à razão, o infinito, como se a insaciabilidade de que padece a nossa faculdade de desejar fosse o reflexo - melhor, o negativo fotográfico - do infinito que chama por nós.

domingo, 18 de agosto de 2013

Palhaços por natureza

Albert Gleizes - Palhaço (1914)

Sempre que se usa de forma figurada o termo palhaço, esse uso toma uma coloração pejorativa. Chega-se a ver o epíteto como uma ofensa contra a honra. Esta recusa generalizada de se ser palhaço é sintoma de algo muito mais profundo do que parece. Na verdade, lidamos mal com aquilo que em nós é ridículo, risível, volúvel e distorcido. A cada momento compomos a máscara e afivelamos traços de dignidade que, como bem sabemos, estamos longe de poder ostentar. Finitos, frágeis e mortais, nós queremos esconder essa realidade que o palhaço, com os seus jogos burlescos e actos cómicos, torna evidente. O palhaço não é um artista, mas o espelho que devolve a nossa realidade material, a nossa natureza destituída de graça, a qual é insuportável para o orgulho da nossa razão.

segunda-feira, 5 de agosto de 2013

Da condição do Homem

Vincent Van Gogh - Naturaleza muerta con pan (1887)

Então eles lhe disseram: Não temos aqui senão cinco pães e dois peixes. (Mateus, 14:17)

Poderemos a partir desta citação de Mateus pensar a condição humana sobre a Terra? A questão central não será, nesse caso, os pães e os peixes, mas o senão. Ele remete-nos para o limite do que possuímos, para o limite dos nossos poderes, para a limitação do nosso ser. Neste senão ou num qualquer apenas expressa-se a natureza humana na sua finitude. Seja o que for o que possuirmos será sempre apenas isso. O que está para além disso é infinitamente mais e incomensurável com o nosso próprio ser. Mas este limite dado pela finitude é a única condição de possibilidade que o homem possui para ir além desse limite. Esta condição de possibilidade reside no reconhecimento da verdadeira situação humana. Só esse reconhecimento permite que algo desça sobre o homem e o multiplique, tal como a bênção do Cristo multiplicou pães e peixes.

quarta-feira, 22 de maio de 2013

Eis aqui o homem

Baldomero Romero Ressendi - Ecce Homo

Saiu, pois, Jesus fora, levando a coroa de espinhos e roupa de púrpura. E disse-lhes Pilatos: Eis aqui o homem. (João 19:5)

Numa sociedade como a nossa, a apresentação do homem flagelado, amarrado, coroado de espinhos, em suma, completamente humilhado, caso a nossa época não estivesse saturada de imagens e não se tivesse tornado insensível a elas, seria uma verdadeira provocação. Os nossos tempos são tempos de homens vitoriosos. Só os vencedores contam. Quem quer rever-se numa imagem de um Cristo humilhado? O cristianismo tornou-se, para as ideias dominantes, aquilo que há de mais repulsivo. A repulsa nasce, em primeiro lugar, da má-consciência - quando existe ainda alguma consciênca - pois este homem humilhado e à beira da execução é a imagem fiel dos milhões de homens humilhados e sobre a dor dos quais se constrói a vitória dos vencedores.

A repulsa tem, porém, ainda outra origem. O que diz Pilatos à multidão ululante? Diz: Ecce homo (eis aqui o homem). Aparentemente, Pilatos estava a apresentar um homem particular, Jesus de Nazaré. Na verdade, porém, ele estava a mostrar à multidão o homem na sua humanidade. Ele devolvia à multidão a imagem de cada um, a terrível imagem da finitude e da impotência humanas perante os poderes do mundo. E é isso que a multidão daqueles dias, assim como os vitoriosos de hoje, não suportam. A arrogância, a velha hübris dos gregos que herdámos e com tanto vigor cultivámos, não suporta a visão do homem finito, limitado e, na verdade, absolutamente impotente perante a desmesura da vida e da morte. Este Cristo abandonado à dor e à morte é insuportável. E é insuportável porque nos detestamos na nossa verdadeira e última condição.

quarta-feira, 18 de abril de 2012

A canção da carne

Max Ernst - La chanson de la chair

Talvez o enigma da carne resida na sua íntima conexão com o tempo. É através dela que entramos no reino da temporalidade. Por exemplo, a experiência da rotação entre dia e noite ou a revolução das estações com o seu eterno retorno ainda não representam por si a experiência do tempo. A experiência directa do tempo nasce da progressiva consciência das metamorfoses da carne. São estas transformações que arrastam o espírito e o prendem no fascínio temporal. Trata-se de um verdadeira queda. A intemporalidade espiritual é arrastada pela carne para a finitude e a mutação. Mas não seria mais sensato falar de corpo em vez de carne? Não. Apesar do corpo, do meu corpo, ser carnal é possível separar um do outro. Pelo corpo, experimento o espaço e o limite da minha figura; pela, carne percebo o tempo e, como disse, a finitude. É através dela que tenho acesso ao fluxo da vida. É este fluxo, onde o espírito caiu, que é uma elegia, a verdadeira canção da carne.