O tempo a tudo destrói
e o teu ritmo cessará
na minha dança outonal,
no instante em que o solstício
abre os dias à luz de Inverno.
Pobre e pálido coração
preso no cintilar da noite.
Novembro de 2022
A rosa presa no espelho
floriu sob o peso do vidro.
Um incêndio feito crepúsculo.
Uma sombra de seiva e pétalas.
Um grito na glória da noite.
A luz morre na lentidão
do corpo cansado da rosa.
Eis o Outono, rumoreja
dentro de si, no fogo eterno
vindo no resplendor das nuvens,
no sol pousado nas acácias
ou nos acordes da manhã.
Uma voz ecoa na poeira
vinda no vento das palavras.
A luz desmaiada da tarde
semeia sombras pelas ruas.
Nos corações, a nostalgia
derrui muralhas e memórias,
ciprestes na luz de Novembro.
Um pássaro poisa na tília
e sonha o silêncio da noite.
A vida extingue-se na luz
crepuscular sobre as tílias.
Nas ruas, morrem os revérberos,
uma procissão de esplendores,
o fulgor cansado da tarde.
Ouvem-se palavras ao longe,
um anjo canta a luz do Outono.
Chegou o tempo aprazado,
da vida a rosa se despede.
Um cântico feito silêncio
cobre a terra com a voragem
do lume inflamado dos dias.
As folhas mortas nos passeios
cantam, aves de âmbar ao vento.
Brama a folhagem no arvoredo,
sob a inclemência do astro.
Amarelos, rudes castanhos,
vermelho quase avinhado,
dobam o destino do verde
que já das folhas se desprende,
pássaro do Sol tão cansado.
Outubro de 2022
Foram-se os dias de tempestade,
partiram as nuvens mais negras.
O Verão acaba em tormenta,
com águas de fúria e raiva,
um rasto de dor nas roseiras.
Os figos cintilam nas cestas,
dádivas roubadas aos campos.
Setembro de 2022
O vermelho das nuvens brilha
em céu maculado de fogo.
Os dias deslizam devagar,
levam para longe os pássaros,
a voz da lira de Orfeu.
Os ventos sopram outonais,
são sombra e silêncio dos deuses.
pelo frio fulgor do Outono.
Debruço-me então na varanda
e vejo-me passar na rua,
sombra tisnada de silêncio.
Digo: nada disto me agrada
e calo-me. Ninguém me espera.
anuncia a vinda do Outono.
Os olhos detêm-se na queda,
subjugados à gravidade,
à perfeita ordem do mundo.
Um cão abriga-se na sombra,
da árvore outra folha cai.
Ouve-se a dança dos instantes
na gélida esquina da aurora.
Desço pela encosta da tarde
e espero que o tempo corra
no vento soprado do bosque.
Soltos, os cavalos da noite
rompem a galope nas ruas.