Mostrar mensagens com a etiqueta Poiesis. Mostrar todas as mensagens
Mostrar mensagens com a etiqueta Poiesis. Mostrar todas as mensagens

quinta-feira, 25 de fevereiro de 2016

Uma mesma realidade

Lima de Freitas - O Contemplador de Mundos (1997)

Um dos passos fundamentais na vida do espírito é a compreensão do equívoco que separa contemplador e coisa contemplada. Esta dualidade funda-se na que opõe produtor e contemplador. Na verdade, em qualquer área da vida do espírito, aquele que produz, aquele contempla e a coisa contemplada são uma mesma e única realidade, fruto do acto de produção que é ao mesmo tempo um acto de contemplação ou vice-versa.

terça-feira, 28 de janeiro de 2014

As mãos na massa

Ramón Rivas - Amassando o pão (1978)

A imagem do pão e do vinho é recorrente na cultura ocidental, nomeadamente na poesia. O seu poder evocador é associado à ideia de partilha - a última Ceia de Cristo, por exemplo - e, através dessa ideia, chegamos à vida comum, a uma forma, sempre sonhada e jamais realizada, de comunidade. É verdade que o pão e o vinho tornam-nos próximos uns dos outros, ampliando os vínculos e consolidando alianças. Todavia, a potência poética do pão e do vinho residirá noutra coisa, residirá na sua própria poeticidade, no facto de também eles serem uma produção (poiesis - ποίησις), de resultarem de uma dinâmica onde os homens são obrigados, literalmente, a pôr as mãos na massa. É este poder operativo que se manifesta na transformação dos produtos da natureza em pão e vinho que ressoa na poesia, como se o poeta intimasse o leitor a transformar-se, também ele, em pão e vinho.

domingo, 9 de outubro de 2011

Da inefabilidade do poema

Poderemos ainda pensar o insondável que se manifesta, ao vir à linguagem, na poeticidade do poético? Se considerarmos esse insondável como um logos apofântico, cuja revelação, permitiria um regime de veridicção, afastamo-nos decisivamente desse núcleo originário de onde brota aquilo que toma forma de poema. O que toma a forma de discurso, mesmo poético, não possui a raiz nesse discurso, mas naquilo que é o prévio do discurso, nesse rumor que percorre o ser e o impele para a palavra. No entanto, esse rumor não deixa de ser o rumor do próprio logos, nessa ânsia de manifestação. Introduzir a metáfora do rumor terá alguma vantagem? Faz-nos abandonar o campo da negação, campo dado em metáforas como insondável ou inefável. Esse rumor, porém, indica ainda um acontecer e a produção (poiésis) desse acontecer. Será nos conceitos de dynamis e energeia que se abre o caminho para a poeticidade do poético. Mas o trajecto terá de ser entendido à rebours da lógica do discurso filosófico. A exploração dos conceitos de dynamis  e de energeia não visa a sua definição e precisão lógico-discursiva, mas uma viagem para o domínio pré-conceptual como preparação para para o salto - trata-se efectivamente de um salto para a consciência comum e também científico-filosófica - para a experiência da dynamis (potência) e da  energeia (acto). Dando, sem análise crítica, como boas as traduções canónicas por potência e acto do par dynamis e energeia, podemos dizer que há que fazer a experiência da potencialidade e da actualidade, não apenas a escuta de ambas, mas a experiência do operar agónico que as conduz e as constitui, para nós, como rumor. Aqui está já presente o logos, mas ainda não cindido e submetido a um regime de veridicção. Neste conflito e amplexo erótico, são expelidas as matérias que o poema fixa através das múltiplas estratégias da escrita poética, mas a poeticidade reside no tumulto da agonía, e o poeta vive na fronteira entre o caos agónico e o cosmos lógico-sintáctico. A inefabilidade do poema reside, aos nossos pobres olhos, no facto de ele ser ao mesmo tempo um guarda-fronteiriço e um emissário desse mundo que se subtrai, na vitória da lógica e da sintaxe, à experiência humana,