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terça-feira, 1 de novembro de 2016

Romaria

Francisco Iturrino - Romaria (1905-09)

Com demasiada rapidez se relaciona a ideia de romaria a uma peregrinação popular, onde se combina a devoção e a festividade. Como a generalidade das expressões de matiz religioso, o termo romaria possui uma dimensão simbólica. À letra significa a peregrinação a Roma, ao centro da cristandade ocidental. Isto significa, na prática, uma viagem da periferia para o centro. Simbolicamente, porém, esta viagem não tem uma dimensão física nem geográfica. Ela é a peregrinação que cada um faz da exterioridade da sua vida social ao centro de si mesmo, à Roma, digamos assim, que cada um traz em si. E esta viagem pelo território interior nem tem de ser religiosa, no sentido corrente do termo, embora ela seja sempre uma re-ligação consigo mesmo. Cada um a fará conforme se sentir chamado ao caminho. Uns pela arte, outros pelo saber, outros pelo ofício, outros pela religião. Todos, de uma forma ou de outra, são convocados à romaria.

quarta-feira, 9 de setembro de 2015

Estar na margem

Vincent Van Gogh - Na margem do Oise em Anvers (1890)

Estar na margem significa não estar no centro do acontecer. A condição marginal é contudo fundamental para que se possa contemplar o que acontece. Não se pense, porém, que a visão periférica é o fim último. Da periferia ao centro, há todo um caminho a fazer. Não para que o marginal se torne o centro de acção, mas para que se descubra a ilusão que há na separação entre a margem o leito do rio.

terça-feira, 2 de junho de 2015

O centro e a periferia

Egon Schiele - Subúrbio I (1914)

O centro atrai os homens pois é ali que reside a possibilidade de reconhecimento e, por isso mesmo, a possibilidade de fama e de glória. O centro é o dispositivo - a grande máquina - que sustenta a vaidade dos homens, que produz o seu fascínio consigo mesmos, que alimenta a grande fábrica do narcisismo. O viandante deve aprender o caminho da periferia, deve amar o subúrbio, deve caminhar para desolação. Não apenas porque abandonou qualquer ilusão sobre si mesmo, mas porque descobriu que é no irrelevante, no desprezado, no subúrbio que fala a voz que o chama, que é aí, onde o reconhecimento foi suspenso, que ele é reconhecido naquilo que é. É aí o verdadeiro centro do mundo.

terça-feira, 26 de maio de 2015

Estar na margem

Henri Rousseau - Nas margens do Oise (1908)

Estar na margem não é ser marginal. Estar na margem não é ser excluído. A margem não é um destino terrível para todos os seres humanos, só para aqueles que sonham estar no centro do palco. Viandante é aquele que descobriu que não há diferença entre a margem e o centro. Para ele, todos os centros são periferias e todas as margens, o centro do ser.

sábado, 21 de fevereiro de 2015

De periferia em periferia

Henri Rousseau - House on the Outskirts of Paris (1902)

Os homens, levados pela vaidade e a frívola ilusão, julgam que o lugar que lhes cabe é sempre o central. E para chegar ao centro do mundo gastam a pouca energia que lhes cabe. O viandante há muito que tomou o caminho da periferia. Por vezes, entra numa casa e descansa, para logo retomar o caminho e, de periferia em periferia, seguir a voz que, na distância, o chama e o conduz para onde a frivolidade dos homens não se deixa arrastar.