Esta é a hora
em que o poeta se senta
e olha a
vastidão das praças,
o deambular
confuso do tráfego
e, suspenso
sobre o enigma do tempo,
pergunta
quem por aquelas avenidas virá
e quais as
palavras que se soltarão para
que outro
mundo venha sobre os jardins
e novos
arquitectos desenhem
a luz e a
sombra, a água pura e a fonte
onde rebanhos
metálicos virão matar a sede.
Deram-te a
cegueira por destino
e a placidez
do sentimento no lugar da exaltação.
As palavras
que te saem dos dedos
de pouco
servem, menos ainda para anunciar
futuros ou
uma graça salvífica.
São apenas traços
na areia, pedaços de cana
seca pelos
ardores de um estio que não acaba.
Apontam-te o
dedo pelo silêncio da acção
e esperam de
ti o dom da profecia,
o empenho do
soldado na batalha vencedor.
Este não é
um tempo de indigência,
apenas os
poetas estão presos ao destino das
palavras, ao
sangue da língua,
pela qual
vieram cegos ao mundo,
e na
ausência de luz tomam uma sílaba,
uma letra, a
precária sintaxe,
e com tudo
isso compõem um stabat mater dolorosa
para que o
mundo possa rumorejar
e a natureza
ferida encontre uma voz,
o suspiro
das agulhas do pinheiro,
o cântico da
água ao despenhar-se na montanha.
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