Caspar David Friedrich - Easter morning (1833)
Retomo um post da Páscoa de 2010.
O mistério pascal, a morte e a ressurreição. Por vezes diz-se
"tempo de Páscoa", mas nunca se percebe nessa declaração a tautologia nela presente. Pensamos que há um tempo de Páscoa, outro de Natal, um de
Carnaval, ou pensamos em tempos profanos, como aqueles onde, nos dias de hoje,
decorre a vida dos homens. Isso ajuda-nos a falhar a compreensão da tautologia.
Entre cada instante e a Páscoa cristã há uma semelhança que talvez seja pertubadora.
A Páscoa dos cristãos é marcada pela morte de Cristo e a sua ressurreição. Ora
esta narrativa plasmada no tempo, entre sexta-feira e domingo de madrugada,
permite apreender a essência do instante temporal. Nas Confissões (IX, 14),
Agostinho de Hipona, enfrenta o tempo com uma aporia: "Se ninguém mo
perguntar, eu sei; se o quiser explicar a quem me fizer a perguntar, já não
sei." Uma aporia é o sintoma de uma dificuldade, quando não de um
mistério.
O que acontece em cada instante é uma morte e uma ressurreição. Na cruz
do instante (cruz, pois lá se cruzam passado e futuro) crucifica-se o ser que
somos mas que deixamos de ser, morremos para o que fomos, que passa a ser
apenas memória e algo passível de rememoração. Mas essa morte é a condição de
possibilidade da vida que está a chegar. Morremos e ressuscitamos, instantaneamente.
A Páscoa ao sacralizar esse instante de morte e ressurreição dá-lhe uma
dimensão absoluta. Na mais relativa das relatividades, o instante, encontramos
a dimensão do absoluto. Ao morrermos, ressuscitamos para a eternidade. Esta já
está aí, embora sejamos cegos para o que está aí. A Páscoa talvez não seja mais
do que um exercício de abertura dos olhos ou de focalização do olhar.
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