terça-feira, 4 de setembro de 2012

Poemas do Viandante (348)

348. AS SIRENES ABREM O DIA PELO RONCO MATINAL

As sirenes abrem o dia pelo ronco matinal
e na atmosfera sente-se o hálito do fogo,
restos de cinza trazidos pelo vento,
os teus olhos cansados de horizontes.
Da vida, nada há para registar,
apenas a preocupação dos dias,
a inquieta certeza de que tudo acabará,
o incêndio breve do desejo vindo pela manhã.

Bebo um golo na garrafa vazia do prazer
e embriagado caminho pelas ruas,
anoto as casas de comércio, o sentido do trânsito,
alguma dor que desce pelo corpo
e se perde no escuro fundo da consciência.
Não há em mim um jardim de outono,
nem da vida sei o sentido ou o valor,
ou nítida função me destinou o ser.

A pálida luz que antecede o meio-dia
pousa como uma sombra sobre a avenida.
Passam mulheres translúcidas e voláteis,
carros de seda em rodas aveludadas.
Os olhos que esperam os meus fecham-se,
aspiram suavemente o ar entorpecido
e abrem-se para uma luz de água selvagem
que brota furtiva no fundo negro da colina.

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