quarta-feira, 18 de julho de 2012

Poemas do Viandante (303)

João Queiroz - Desenhos a carvão

303. ERA UM TEMPO DE DESAMPARO

era um tempo de desamparo
estrada fora
ia preso à sujidade das  mãos
aos dedos grossos
levedados nos campos
as calças rotas sapatos cambados
um cordel por cinto

chegava à aldeia nos dias nublados
sem calor nem chuva
e batia à porta dos pobres
menos pobres
à espera de pão
uma moeda
a sopa fria vinho azedo

esquecera as violetas
e na face não havia sorriso
dor acusação
vinha no orgulho da pobreza
na liberdade da sombra
o chegar e partir
sem declinar nome ou ofício

voltava na privação e olhava-me
de olhos apagados
e eu quieto e hirto tremia
no silêncio da infância
na meia-luz da pérgula

toda a culpa
e toda a penúria ardiam em mim

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