Com o passar dos anos a morte biológica torna-se cada vez mais presente, mas, ao mesmo tempo, o temor que nos acomete nos anos da juventude, um temor secreto e inconfessado, vai-se dissipando como se a própria natureza fizesse ouvir no ser biológico a verdade dos seus imperativos. Aprender a morrer e a estar morto era o exercício que Platão, no Fédon, dizia constituir a natureza da filosofia. Mas esta aprendizagem da morte não é o desejo de pôr fim à vida, mas o exercício contínuo do desprendimento. Aprender a desprender-se daquilo que nos rodeia não é indiferença perante o mundo. O desprendimento parece antes ser uma via para a verdade do meu próprio ser. Só na verdade de mim é possível criar o espaço onde tudo o que é ganha um novo sentido. Este sentido nasce das coisas serem consideradas já não a partir da fractura da propriedade, do que é meu em oposição ao que é teu e ao que é do outro. Não é que os direitos de propriedade possam ou devam ser violados, mas devem ser remetidos para a esfera do animal que labora e, apesar desse animal ser humano, a propriedade não é menos, por isso, um instinto animal. Desprender-me da minha propriedade, mesmo que ela continue minha, é aprender a desprender-me da minha dimensão biológica ou, talvez seja o termo mais adequado, zoológica. Aprende-se a morrer morrendo para o que é próprio e aquilo que há de mais próprio no homem é o desejo de propriedade. O próprio escravo deseja-se proprietário de si. Talvez a experiência da liberdade só possa nascer desta aprendizagem do desprendimento.
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