O que resiste dentro de mim a um abandono ao que a Providência me enviar? Talvez um medo, o pavor do desconhecido, o terror de me perder. Se estou perdido, não o estou ainda suficientemente para não ter medo de me perder ainda mais numa noite da qual não diviso os contornos. Sim, é sempre possível dizer que a exterioridade impede o caminho para os decretos da Providência, mas haverá de facto uma cisão entre interior e exterior, entre aquilo que digo pertencer-me e o que está para além do círculo que julgo ser a minha pessoa? Enquanto houver um interior e um exterior, terei sempre o meu lugar assegurado. E que lugar será esse? O de guarda fronteiriço. Este administra o trânsito entre os dois lugares e toda a sua existência está fundada no serviço que assim presta. Mas se não houver fronteira, não haverá um dentro e um fora, nem guarda fronteiriço. Mas se eu não sou o guarda fronteiriço, o que serei? O que farei se a fronteira for abolida? Nela ainda encontro um lugar para descansar dos caminhos em que me perco; sem ela tudo se torna indiferenciado e não me resta mais do que me abandonar à sorte que me for enviada. A fronteira é a esperança do guarda fronteiriço perante o terror de se perder.
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