quarta-feira, 20 de junho de 2012

Poemas do Viandante (275)

João Queiroz - Sem título (2007-2008)

275. O DILACERADO CORPO DA TERRA ABRE-SE

o dilacerado corpo da terra abre-se
um segredo de calcário
os mármores incertos do palácio
agora incêndio nas trevas do olhar

ao subir a encosta escarpada
os dedos rememoram o tempo primitivo
os dias tecidos pelo medo e a fome
o corpo exposto na clareira
ao uivo dos predadores
ao voo rasante das aves migradoras

assim crescem os anos
conto-os no breve rosário de pedra
e desenho calendários de folhas
onde anoto cada dia
o mal que consigo traz
e a esperança sempre perdida
de algum bem

traço uma cruz de carvão na pedra
e oiço o eco solitário de uma voz
o corpo freme
balança-se e na inclinação
entrega-se à dúvida 
à imprecisa fronteira 
do infinito céu a precária terra separa

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