Raquel Forner - Mulher de Lot (1935)
Um dos episódios mais estranhos do Antigo Testamento é o da transformação da mulher de Lot em estátua de sal. A fuga da família de Lot, aquando do castigo de Sodoma e Gomorra, tinha como condição não olharem para trás. Esta estranha condição não é diferente da que foi imposta a Orfeu na sua tentativa de libertação de Eurídice do reino da morte. Não olhar para trás, não procurar a certificação do caminho com uma visão retrospectiva. Poder-se-ia ver nesta história da mulher de Lot ou no mito de Orfeu uma certa atenção ao futuro. Isso, porém, seria falhar o essencial. O castigo de Orfeu ou da mulher de Lot deve-se à incapacidade de estarem presentes, de se moverem aqui e agora, de se deixarem seduzir pelo que fica para trás ou pela necessidade de uma certeza. Em ambos os casos, o que está em jogo é o desejo, o desejo de uma certeza, mas também o desejo de algo que passou, e cuja memória, certificada pelo olhar retrospectivo, petrifica o espírito e o transforma numa estátua de sal.
Simples e claro. Muitos anos para tentar entender esta passagem, a sua ajuda foi preciosa. Obrigado.
ResponderEliminarÉ uma linha de leitura, haverá, claro, muitas outras, pois os textos possuem tal riqueza que não é possível esgotar-lhe o sentido potencial. Muito obrigado pela visita.
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