Pablo Picasso - A vida (1903)
426. Um fio que se quebra e abra para a morte
Um fio que se quebra e abre para a morte,
o desejo impossível sobre a varanda,
o rumor de julho na planície incendiada.
A vida chega a arder nos dedos de cristal,
rodopia sob a fadiga do vento,
ri-se desfigurada pela ânsia perpétua.
O silêncio da criança nos braços da mulher,
a memória traçada de fronteiras e rios,
o animal que se inclina e pede água.
Trago no labirinto toda a vida que me foi dada,
olho-a aterrorizado pelo que anoiteceu,
e sento-me escutando o tropel do que há-de vir.
Ó a vida nua, pura, delicada e breve:
ébria, uma erva pende para a terra
e no céu um anjo voa no silêncio eterno.