É um momento
severo de desamparo e oclusão.
As folhas
deslizam secas na terra quente
e os gatos,
a noite os semeia, ocultam-se na sombra
que
escorrega de alguma nuvem perdida no céu.
Não é tempo
de discórdia nem de harmonia,
apenas as
horas passam exaustas e brancas,
transpirando
na indecisão dos teus dedos.
Ouve-se um
grito ou a fala apressada de quem
não tem
idade e da vida tudo espera.
A cidade
macera lentamente ao ritmo dos que passam,
vielas e
recantos albergam olhares furtivos,
traços de
luz suspensos na caliça das paredes.
Os dias
estão semeados de terríveis hesitações,
símbolos
puros à espera de precária decifração.
No pórticos
das igrejas, pedintes e pombos traçam
roteiros e
mapas, e toda a miséria ganha um rosto,
a cor
designada que irrompe na lividez da alma.
Os dias que
nos cabem estão cansados,
e aqueles
que um dia amaram desmedidamente
sentam-se à
espera de uma carta longínqua,
de um amor
que o tempo vendeu ao esquecimento.
Uma paliçada
de canas separa a tua da minha casa
e, quando o
vento sopra trazido pelo norte,
escuto a
música perdida na lira de Orfeu.
Um tremor
floresce na esplêndida fronteira
traçada,
e irrompe na
clareira onde um animal,
cru e
selvagem, esboça uma dança luminosa
e, ambulante, se perde na sombra que cai no umbral.