Jorge Molder, O Pequeno Mundo, 2020 (Gulbenkian) |
domingo, 24 de dezembro de 2023
No limiar (13)
sexta-feira, 22 de dezembro de 2023
Sonetos de Inverno (1)
Pedro Calapez, Viagem de Inverno, 1989 (Gulbenkian) |
Vem
solstício. Do Inverno a luz
abrirás,
e os segredos da noite
brilharão
entre estrelas e luas,
entre mares
de azul e cobalto.
Ó intróito
da invernia, paroxismo
do silêncio
e das trevas amargas.
Crescerão
depois os dias, canções
haverá pelos
lugares sem nome.
Ao cair, a
noite ergue-se frágil
no murmúrio
da floresta, rumor
das
estrelas, sal secreto da vida.
Uma cruz de
azevinho ao longe,
velhos
cânticos, Natal no horizonte.
A luz pálida
será fogo ardente.
quarta-feira, 20 de dezembro de 2023
O sal do silêncio (108)
Mathilde Battenberg, Provence landscape, 1914 |
segunda-feira, 18 de dezembro de 2023
A sombra da água (23)
Carl Rottmann, Santorini (Thira), c. 1843 |
sábado, 16 de dezembro de 2023
Sonetos de Outono (12)
Jan Van Goyen (atrib.), Dirt Road with Farmhouse and Board Fence, 1629 |
Adeus,
Outono, o aprazado tempo
chegou com
folhas mortas, água fria,
vento de
Norte e a saudade súbita
de quem
partiu e não virá jamais.
Recolho a
casa, deixo as ruas sujas,
praças
vazias, a memória trémula
do verso
esquivo e das sombras ténues,
onde
escondia o ardor do fogo.
Ramos
despidos clamam, vozes duras,
vozes de
Inverno, flores, sal e lágrimas.
Os dias
decrescem no rumor das nuvens.
Grande
mistério é a noite escura
onde um deus
aguarda a hora próxima
para lançar
na terra o sol e a sombra.
quinta-feira, 14 de dezembro de 2023
A memória do ar (22)
Carl Philipp Fohr, Cloud Study, c. 1816/17 |
terça-feira, 12 de dezembro de 2023
Sonetos de Outono (11)
Antonio Tápies, A caída, 1982 |
pela diáspora
da vida simples,
pela aurora
doutro tempo a vir.
Eis o
silêncio desta noite sôfrega.
Amargas
dores, corações rasgados.
O abandono é
semente ávida,
germina fácil
no mortal terreiro
onde o ser
em névoa fria se oculta.
Não veneremos
o clamor dos deuses
sujos de
sangue ou da cal da morte,
filhos de rosas
sem o véu da cor.
Sim, é de
ferro o anel de ouro.
Sim, é nocturna
essa luz do dia.
Sim, é de
sombra a alva nau de Outono.
Dezembro
de 2023
domingo, 10 de dezembro de 2023
sexta-feira, 8 de dezembro de 2023
Sonetos de Outono (10)
Alfred Sisley, Bank of the Seine in Autumn, 1876 |
Como um
pássaro já ferido canto
uma canção
feita silêncio e dor.
Oiço o ritmo
ancestral na fímbria
das folhas secas,
no vazio da alma.
Trago em mim
cada Outono vivo,
cada Outono
preso aos dias passados,
ao
calendário feito de erva fresca
e de
memórias para sempre mortas.
Deixo que o
ser na luz se revele livre,
na liberdade
do mistério aberto
como um
livro de orações sagradas.
Vou pela
estrada sem destino claro,
sem o fulgor
dos dias de Estio, acesos
no
esquecimento do ardor da noite.
Dezembro de 2023
quarta-feira, 6 de dezembro de 2023
Meditação breve (192) Vibrações
Rafael Barradas, Paisaje vibracionista, 1918 |
segunda-feira, 4 de dezembro de 2023
Sonetos de Outono (9)
Vincent van Gogh, Camino con sauces podados, 1889
Nascem
desejos em turvado céu.
As nuvens
correm no silêncio vivo,
anunciam
chuva entre os ramos secos.
Flores e
frutos da memória caem.
Os dias
obscuros, uma fria tristeza,
pálido sol, rosas
de cor amarga,
eis o Outono
no lençol de linho
tecido em
dia de tempestade e fúria.
Soltam-se
ventos sobre as ruas vazias.
Olho a tarde
em abrigo cálido,
deixo correr
ao vento o sal do mar.
Pobres, os lábios
exaltados sopram
velhas
canções de vinho, luz e mágoa.
Eu oiço,
oiço-te, ó voz silente.
Dezembro
de 2023
sábado, 2 de dezembro de 2023
O sal do silêncio (107)
quinta-feira, 30 de novembro de 2023
Sonetos de Outono (8)
Caspar David Friedrich, Autumn, 1826 |
sobre as
ruas vazias da cidade velha.
O tempo
corre entre folhas secas
presas nos
ramos de cansadas árvores.
Ouvem-se
gritos de amargura tensa,
rasgam a
tarde como corvos tintos
pela tristeza
de perdidas guerras,
velhos ardores
dum império findo.
Deixo o
espírito vogar nas sombras,
a tarde as
traz presas ao corpo gélido,
ao abandono da
memória breve.
Passo o cabo
das tormentas, ergo
as mãos aos
astros no licor amargo
dos dias de chuva,
no frio mar da morte.
Novembro de 2023
terça-feira, 28 de novembro de 2023
Geometrias de fogo (22)
Hans Thoma, The War, 1907 |
domingo, 26 de novembro de 2023
Signo sinal 15. Suspensão
Rudolf Schlichter, O mundo inanimado, 1926 |
sexta-feira, 24 de novembro de 2023
Sonetos de Outono (7)
Camille Pissarro, Outono, 1876 |
de novos mundos,
novas terras, nova
luz no
orvalho da aurora pálida,
nos desavindos
corações sombrios.
Traz o
fulgor a estes dias cegos,
às noites
frias onde o musgo verde
amadurece na
memória muda
de um
presépio esquecido, morto.
Oiço o
silêncio da floresta viva.
Vejo-o dançar
na cornucópia alegre
destas cidades
de cristal e pedra.
Canto o
devir vão da manhã de bruma,
o abandono do
jardim perene
ao sal de
fogo, aos sinais de Inverno.
Novembro
de 2023
quarta-feira, 22 de novembro de 2023
A sombra da água (22)
Karl Schmidt-Rottluff, Lua sobre a costa, 1956 |
segunda-feira, 20 de novembro de 2023
Pintura e haikus (35)
Bodil Obberg Pettersson, Early Autumn, 1980 (aqui)As cores de Outonodeslizam na tela fria. São sombras sonâmbulas. |
sábado, 18 de novembro de 2023
A memória do ar (21)
quinta-feira, 16 de novembro de 2023
Sonetos de Outono (6)
Wassily Kandinsky, Autumn in Bavaria, 1908 |
Os corações tão
desejosos cantam
os dias de
Outono, a chegada alegre
do vinho
novo, sangue, sol e água.
No céu, os
pássaros desenham símbolos,
inscrevem letras
na paisagem fria,
presos no
voo entre terra e nuvens,
soltos no fogo
que alastra trémulo.
Oiço o
silêncio no rugir do vento
ou no rumor
das tuas mãos abertas,
leves, na dádiva
da noite escura.
Toco os teus
lábios com o vinho novo,
bebo-te, casta,
no deserto árido.
Viajamos
ébrios na vertigem muda.
Novembro de 2023
terça-feira, 14 de novembro de 2023
Impressões 114. Lugares de dor
Mario Sironi, Paesaggio urbano, 1942 |
domingo, 12 de novembro de 2023
Geometrias de fogo (21)
Hans Baldung Grien, Two Witches, 1523 |
sexta-feira, 10 de novembro de 2023
Sonetos de Outono (5)
William B. Post, White Mountains, N. H. from Fryeburg Maine, 1900-1910 |
Folhas de
Outono, caminhamos livres
na liberdade
da floresta rude.
Vamos
curvados no carril do tempo
e levantamos
aos céus olhos lívidos.
Na
cornucópia da abundância vemos
as velhas
árvores caídas, mortas
no desmedido
desejar dos dias.
Sinais do vento
que passou silente.
Estreitas
ruas levam do mar à morte,
onde os
anjos te aguardam cegos
para a
terrível luz das ervas secas.
Pela
penumbra avistamos luas,
pequenos sóis
de gelo e âmbar,
a cintilante
flor de luz e fogo.
Novembro de 2023
quarta-feira, 8 de novembro de 2023
No limiar (12)
Fernando Calhau, S/título #169, 1974 (Gulbenkian) |
segunda-feira, 6 de novembro de 2023
O sal do silêncio (106)
Emilio Sánchez Cayuella, Silencio, 1985 |
sábado, 4 de novembro de 2023
Sonetos de Outono (4)
Camille Corot, Italian Landscape near Marino in Autumn, 1826 – 1827 |
Dias de Outubro. Uma ave canta
e eu medito
na ruína próxima,
a casa pobre,
o nome ferido
por entre
sombras e silêncios secos.
Erguem-se
pássaros de luz e trevas.
Os rios
deslizam devagar, sem rumo.
Subitamente,
o mar cala a voz
nas ondas
frias, no vagar do vento.
Não tenho
herança a deixar na morte,
nem a
memória reterá o nome
por mim
herdado ou talvez roubado.
Oiço-te, pássaro da noite a vir.
És a
renúncia ao fulgor dos dias.
És os
escombros duma vida vã.
Outubro de 2023
domingo, 22 de outubro de 2023
segunda-feira, 16 de outubro de 2023
Impressões 113. Pela janela
Fritz von Uhde, By the Window, 1890 – 1891 |
sábado, 14 de outubro de 2023
A sombra da água (21)
Paul Signac, Venice, Grand Canal, 1904 |
quinta-feira, 12 de outubro de 2023
Sonetos de Outono (3)
Dórdio Guimarães, Casas de Malakoff - Paris, 1923 |
Chegou a
hora de dobar o fio
das tardes
calmas pela luz cobertas,
das noites
ébrias no cruel temor
escrito a
negro em coração cansado.
Rompem as
árvores a linha da sombra,
abrem os
ramos outonais ao vento,
as aves
poisam, são crianças de água
abandonadas
no desvão das ruas.
Atravessei
maravilhado o bosque,
ouvi o fogo
crepitar nos campos,
vi uma cruz
de dor na terra rude.
Escuto os
lobos murmurar ao longe,
dentro da
minha carne crua e fria.
As folhas
caem, e eu caio com elas.
2023