Emmerico Nunes, sem título, 1908 |
Entre
todos os salões que frequentei havia um especial. Nele, uma pianista dava um
pequeno recital. Nunca passava de meia-hora. Todos diziam ser perfeita a sua
técnica e grande o talento com que nos fazia imaginar as mais diversas cenas. Muitas
vezes me senti numa paisagem bucólica ou experimentei a vertigem causada pelo
perigo que nos espreita no mar ou no alto de uma montanha escarpada. A última
vez senti-me um gato. O pior é que os outros convivas passaram a ignorar-me ou enxotavam-me
com rudeza. Se lhes dirigia a palavra, clamavam que o gato não parava de miar. Mesmo
a dona da casa chegou a pegar-me ao colo, o que me desconcertou, e fazia-me
festas como se eu ronronasse.