Há na conduta viciosa qualquer coisa que merece meditação. Não refiro o vício nas suas dimensões moral e social, ou mesmo na dimensão ética, se distinguimos esta, de natureza mais pessoal, da moral, de natureza mais colectiva ou gregária. A dimensão que merece meditação é a do espírito. No vício, através dos processos de iteração inerentes à conduta viciosa, o espírito fecha-se nesse acto de pura repetição, já sem consciência, de uma conduta marcada pela necessidade. O vício começa então por ser uma prisão onde o espírito aliena a liberdade. Ao alienar a liberdade afasta-se da sua natureza. O vício antes de ser um problema do indivíduo na sua relação consigo e com os outros é um problema do espírito, que assim é negado. Mas por que há essa necessidade de alienar o espírito? Porque este é atraído por uma luz que o ultrapassa e lhe dá ser. Mas essa luz tão obscura e espessa, e ao mesmo tempo excessivamente luminosa, faz o espírito tremer. Perante este "temor e tremor", o espírito foge de si e defende-se na alienação do vício, isto é, da conduta que prende o espírito na terra estranha da necessidade e da pura repetição da nulidade. O vício é o exercício contínuo de fuga perante o único real efectivamente real.
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