quinta-feira, 25 de outubro de 2012

Haikai do Viandante (95)

Edvard Munch - Alameda con copos de nieve (1906)

Neve na alameda,
pequenos flocos de orvalho,
fogo e labareda.

quarta-feira, 24 de outubro de 2012

Poemas do Viandante (377)

Georgia O'keeffe - A Black bird with snow-covered red Hills (1946)

377. Pássaro negro

Pássaro negro, 
sombra despida 
de gravidade.
Traço no céu,
uma promessa
de eternidade.

terça-feira, 23 de outubro de 2012

Haikai do Viandante (94)

Vázquez Díaz - Otoño en Fuenterrabia (1918)

Segredos de Outono:
as cores vibram no bosque,
se em ti me abandono.

segunda-feira, 22 de outubro de 2012

Do céu, da terra e do homem

José Ramón Zaragoza - Prometeo encadenado

Há dias, perante uma certa polémica que se levanta em torno de figuras como Slavoj Zizek e Alain Badiou, alguém me acusou de ser humanista. Zizek e Badiou, dois pensadores com bastante destaque mediático nos dias de hoje, são herdeiros da tradição anti-humanista que cresceu em França à volta do estruturalismo. Os pensadores estruturalistas, em oposição ao existencialismo de Sartre, vieram declarar a morte do homem. As posições humanista e anti-humanista tiveram em Portugal representantes fora do campo da filosofia. Vergílio Ferreira e Eduardo Prado Coelho, respectivamente. Não sendo eu um particular adepto das posições de Zizek e de Badiou, só podia ser um humanista.

A questão do humanismo deve ser colocada, porém, na sua fonte moderna. Os humanistas surgem no final da Idade Média e representam um movimento que pretende ultrapassar a visão teocêntrica do mundo e colocar o homem, a humanidade, como o centro da acção do próprio homem. Este humanismo foi tomando múltiplas colorações - as mais díspares, diga-se - ao longo da modernidade. O cartesianismo, o iluminismo, o liberalismo e o utilitarismo, o marxismo ou o existencialismo, são exemplos desse triunfo moderno do homem sobre a sombra de Deus, exemplos de uma visão prometaica da mundo. Este humanismo foi desafiado pelo estruturalismo, o qual substituiu o homem pelas estruturas, sejam as da linguagem, as sociais e económicas, as do psiquismo, etc., numa proclamação da morte do homem, depois da proclamação nietzschiana da morte de Deus. 

Na verdade, a querela interessa-me pouco. Falando psicanaliticamente, o humanismo não passa de um narcisismo da espécie humana e o anti-humanismo de um sado-masoquismo, marcado pelo prazer-dor de dissolver o homem. Não acho que o homem esteja morto nem que seja o centro do universo. Utilizando a simbologia extremo oriental, diria que o homem está entre a terra e o céu. É o mediador entre aquilo que está abaixo dele e aquilo que o ultrapassa. Nesta ultrapassagem, contudo, não penso o sobre-homem nietzschiano, aquele que vem depois do homem. De certa forma, estarei muito mais perto da concepção medieval do que de quaisquer dos contendores da querela do humanismo e do anti-humanismo. Não que pense na possibilidade de um retorno à Idade Média. Não há retornos na História. O fundamental é pensar que o que há de mais elevado, aquilo que a tradição chinesa denomina como céu e a ocidental como Deus, seja o centro dinâmico da vida dos homens, mas de homens que substituíram o princípio de autoridade pelo princípio da liberdade, e por isso são modernos.

domingo, 21 de outubro de 2012

Haikai do Viandante (93)

Martial Raysse - Cela s'appelle l'aurore (1964)

Luz na madrugada
abre o dia e afasta a noite,
que parte cansada.

sábado, 20 de outubro de 2012

Sonetos do Viandante (4)

Gino Rubert - Deliri

4. Um súbito ardor no rosto pálido

Um súbito ardor, pálido o rosto...
Nos olhos, uma luz aberta ao jogo
do amor, e em cada mão a casa vazia,
o lugar onde espera a chama viva,

secreta e silenciosa, que abre o dia.
E nessa incerteza, deixa o ventre
pulsar leve e tranquilo, um mar de seda,
uma fonte, erva doce nos meus lábios.

Sou um velho barqueiro que olha o mar.
Sob o império do vento, negras nuvens
anunciam tempestades e naufrágios.

O abismo… nele a morte lançou âncora,
e desenhou, perfeita, a armadilha
onde o meu coração no teu cairá.

sexta-feira, 19 de outubro de 2012

Poemas do Viandante (376)

George Grosz - Blauer Morgen (1912)

376. O dia veste-se de outono

O dia veste-se de outono
e sobre as casas verte
a sombra de um lamento. 

Na fria luz da manhã 
uma árvore despe-se,
e nua abre-se ao vento.

quinta-feira, 18 de outubro de 2012

Poemas do Viandante (375)

Eugene Louis Boudin - Jetty and Wharf at Trouville (1863)

375. O deserto silêncio

O deserto silêncio 
na praia devastada,
o barco fundeado
no velho cais
lembram dedos
de uma mão aberta,
perdidos na tarde
entre cinzas e corais.

quarta-feira, 17 de outubro de 2012

Haikai do Viandante (92)

Carlos Morago - Arboleda (1998)

Sombra e arvoredo,
e na clareira deserta
enfrentas o medo.

terça-feira, 16 de outubro de 2012

Haikai do Viandante (91)

Juan Romero - Bird-Birds (1987-90

Pássaros ociosos
voam em bandos pelo mundo
leves, silenciosos.