quarta-feira, 28 de abril de 2010

Poemas do viandante

97. ÁRVORES

começaram a florir
as lentas árvores da cidade
rebanho perdido
nestes dias
que maio chama
para a rápida morte

ainda nada está decidido
estendem para o céu
as pobres árvores
os ramos
dedos cansados
de tanto florir

cobertas de folhas
esperam o Outono
o frio que te há-de
despir

segunda-feira, 26 de abril de 2010

Poemas do viandante

96. FLORESTA

a floresta tardia
veste-se de
natureza caligráfica
arvora letras
sílabas indecisas
as primeiras palavras
com que o vento
então falava

domingo, 25 de abril de 2010

Poemas do viandante

95. ESPLENDOR E CINZA

no jardim virado ao pretérito
traço a rua por onde
imóvel
caminhas

vens
sem vestes luminosas
esplendor e cinza
dos meus olhos

sábado, 24 de abril de 2010

Poemas do viandante

94. OS QUATRO ELEMENTOS: TERRA

montes sobre a planície
a ilha a que chamas
presente
poeira lançada sobre o muro
daquela casa
que é uma lezíria

assim tão sólida
recorda campos baldios
à espera que mendigos cheguem
e de joelhos
estendam a ferida mão
sobre a poeira da terra

sexta-feira, 23 de abril de 2010

Poemas do viandante

93. OS QUATRO ELEMENTOS: ÁGUA

uma orquídea
o rumor de algum pássaro
a pele suada
à luz da tarde

deixo cair a mão
sobre a névoa do meio-dia
e afogo-me na água
onde tudo arde

quinta-feira, 22 de abril de 2010

Poemas do viandante

92. OS QUATRO ELEMENTOS: AR

nem sempre é naufrágio
o que derrota os barcos
e devolve o marinheiro a terra

nem sempre é medo
o que cala o solitário
e na escuridão o encerra

há ainda o vento
sopra onde quer
e para aqui ou ali te leva

quarta-feira, 21 de abril de 2010

Poemas do viandante

91. OS QUATRO ELEMENTOS: FOGO

o lume arde
nesses dedos
cobertos de seda
vestidos de cambraia

o lume é uma máquina
decepa as mãos
na vindima ardente
de uma ilusão

sonhos são sedas
e cambraias a arder
nos dedos mecânicos
da decepada mão

lume
o sonâmbulo sonho
onde te escuto
sob a copa desta faia

terça-feira, 20 de abril de 2010

Poemas do viandante

90. MÃO QUEBRADA

uma ligeira comoção
a nortada uivava
e o coração desordenado
crescia
tumor ancorado
na falência das células

nasci sob o princípio de incerteza
a mão quebrada
o toiro cantando
na solidão da arena
a tua voz ao longe a sussurrar
no desamparo de mim

segunda-feira, 19 de abril de 2010

Poemas do viandante

89. PALAVRAS

as palavras ditas
véspera das que hão-de vir
cobrem de rugas
o palácio

deixam um hálito vulcânico
sobre a mesa
um longo verão
sem pão e vinho

o rosto
pássaro pousado
na sóbria memória

chamaste-lhe morte

domingo, 18 de abril de 2010

Poemas do viandante

88. CANTO

um frio silêncio caiu
a pedra branca talhada
indício de fogo e gelo
o espaço feito noite
a palavra desaguada
sacudida de esperança

canto
é tudo o que resta
se a sombra de tuas mãos se vai

canto
no frio silêncio do gelo
no fogo da palavra
no espaço sem esperança

canto
e a súbita primavera ateia

de flores o velho castanheiro