114. PALAVRA
a palavra
sombra
de água
no jardim
a que chamas
porto
navios
gaivotas
círculos
sobre os ombros
aí suportas
o mundo
quinta-feira, 8 de julho de 2010
quarta-feira, 7 de julho de 2010
segunda-feira, 5 de julho de 2010
Dessubjectivação
Um dia de calor. Tudo se torna mais difícil. Aquilo que se exige é agora, mais que em outros dias, um campo de negação de si mesmo, um território de oblação e sacrifício. Cumprir cada uma das tarefas, não esperando nada delas, mas oferecendo-as como aprendizagem do esquecimento de si. Uso a palavra dessubjectivação. Este cumprir do dever como uma entrega e negação da vontade própria é uma forma de dessubjectivação, um rasgar da máscara, um passo para além da ilusão da nossa substancialidade. A dessubjectivação não é obrigatoriamente, como muitas vezes acontece, uma alienação, um estranhamento. Pode ser um passo para a clareira onde O que não vemos se manifesta. No sacrifício das tarefas quotidianas encontramos um caminho, um difícil caminho para quem sente o apelo da quietude. Mas há que cumprir essa Vontade que não é a nossa.
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Sujeito,
Vontade
sábado, 3 de julho de 2010
Poemas do viandante
112. FOLHA
a folha tocada
pelo silêncio
inclina-se
deixa o vento
passar por ela
suspende a noite
se a seiva
dos teus dedos
se demora nela
a folha tocada
pelo silêncio
inclina-se
deixa o vento
passar por ela
suspende a noite
se a seiva
dos teus dedos
se demora nela
segunda-feira, 28 de junho de 2010
Poemas do viandante
111. NOITE
um jardim
no silêncio do mar
a noite aberta
pela raiz
algas e mãos
a face lívida
na súbita
ondulação
aí me perco
para te escutar
um jardim
no silêncio do mar
a noite aberta
pela raiz
algas e mãos
a face lívida
na súbita
ondulação
aí me perco
para te escutar
quinta-feira, 24 de junho de 2010
Poemas do viandante
110. CÂNTICO
tudo reverbera
fecho os olhos
e vejo-te
no cântico
que ao declinar
o dia traz
tudo reverbera
fecho os olhos
e vejo-te
no cântico
que ao declinar
o dia traz
quarta-feira, 23 de junho de 2010
Poemas do viandante
109. TARDE
a tarde sobre
a ravina
pássaros de papel
e sangue
a buganvília
na sombra
da qual
espero
a tarde sobre
a ravina
pássaros de papel
e sangue
a buganvília
na sombra
da qual
espero
terça-feira, 22 de junho de 2010
Sobre a morte de José Saramago
Nestes dias, aqueles que a morte de José Saramago ocupou, muitas coisas sem nexo foram ditas. Sublinho, no entanto, aquela que assumiu o cúmulo da irrelevância. Disse L'Osservatore Romano que Saramago "foi um homem e um intelectual de nenhuma admissão metafísica, ancorado até ao fim numa confiança arbitrária no materialismo histórico, aliás marxismo." Como é possível dizer uma coisa destas? Em primeiro lugar, porque o materialismo dialéctico e o marxismo não passam de metafísica, de uma dada metafísica materialista, mas ainda e só metafísica. Em segundo lugar e mais importante, porque, tendo em conta aquilo que li de Saramago, só a metafísica o parecia interessar.
Mesmo a blasfémia, se é que Saramago era um autor blasfemo, é um louvor a Deus. Mas a recorrência da temática religiosa nas suas obras, mesmo que sejam pequenas notas de raspão, é um confronto de uma subjectividade com o terrível silêncio de Deus. Em Saramago havia uma pulsão de neo-converso ao contrário. Era como se o escritor fosse uma espécie de Paulo de Tarso, mas aspirasse ser um João Evangelista ou, de outra forma, um daqueles monges do deserto que fazem a história inicial da mística cristã. Perante a impossibilidade, ele assumia-se então como um S. Paulo ainda quando tomava o nome de Saulo.
A obra e a personalidade do escritor são o exemplo de uma luta metafísica, uma luta trágica, e deveriam merecer uma atenção redobrada, em vez da lamentável nota de L'Osservatore Romano. Saramago é um exemplo de como a crença na subjectividade própria impede de escutar Aquele que fala no silêncio e na pobreza do deserto. A ânsia de encontrar Deus, de o fazer manifestar-se, e a ânsia de salvar o ego tolheram em Saramago o caminho, transformaram-no numa luta titânica desvairada e fecharam-no dentro de si e no mundo, sempre um pequeno mundo, por amplo que seja. Há aqui mais do que um simples negador, há aqui um exemplo do destino do Ocidente. E não apenas daqueles que não conseguem silenciar-se, não conseguem silenciar a ânsia e o desejo que povoa o ego empírico, para que possam escutar Quem fala, mas também um exemplo de como aqueles que detêm o depósito da palavra já não a percebem ou não conseguem dá-la a perceber.
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Silêncio
Poemas do viandante
108. INCLINAÇÃO
tudo se tornou
mais raso
a água
o fogo
as planícies
pelo sul
inclino a cabeça
e oiço uma voz
branca
no verde
da colina
de onde espreitas
tudo se tornou
mais raso
a água
o fogo
as planícies
pelo sul
inclino a cabeça
e oiço uma voz
branca
no verde
da colina
de onde espreitas
quarta-feira, 2 de junho de 2010
Poemas do viandante
107. SOMBRA
emudecido
as mãos cobertas
de pústulas
uma noite
de palavras
e sombra
rasto na areia
a saudade
na janela
de onde avisto
o silêncio
que espera
emudecido
as mãos cobertas
de pústulas
uma noite
de palavras
e sombra
rasto na areia
a saudade
na janela
de onde avisto
o silêncio
que espera
terça-feira, 25 de maio de 2010
A questão e a resposta
Nous devenons nous-mêmes Son écho et Sa réponse, comme si, en nous créant, Dieu nous avait posé une question, et qu'en nous appelant à la contemplation Il y répondît, de sorte que le contemplatif est, à la fois, question e réponse. Thomas Merton (1963). Semences de contemplation. Paris: Seuil, p. 11.
Quando se fala do homo viator, daquele que é viandante, fala-se do que faz a viagem entre a questão posta e a resposta a dar. De certa maneira, qualquer ser humano, e não apenas o tecnicamente contemplativo, está na viagem que vai da questão posta à resposta a dar.
O jogo do questionar e do responder, porém, não é tão fácil como aparenta à primeira vista. Se na sua formulação parece, e de certa maneira é, um jogo infantil, a quantidade daqueles que deambulam sem saber que questão são ou que resposta representam mostra a dificuldade e os perigos da aventura.
A primeira dificuldade nasce na nossa incapacidade em nos tomarmos por uma questão. Habituámo-nos, desde a hora que nascemos, a representarmo-nos por uma frase declarativa (eu sou x, ou eu sou y; a estrutura destas frases pode ser designada assim: a é b). Esta declaratividade tranquiliza-nos e põem-nos em segurança. Mesmo que, mais tarde, duvidemos do conteúdo proposicional da declaração (isto é, não saibamos bem se somos x ou y), somos incapazes de olhar para nós mesmos como questão.
A primeira razão deve-se ao fascínio da declaratividade. Mesmo que o conteúdo da frase declarativa seja posto em causa, a sua forma impregnou-se de tal modo no nosso espírito que somos incapazes de ir para além dessa estrutura (a é b). Decepcionados com o conteúdo, procuramos sempre e sempre novos conteúdos. Cada novo conteúdo da proposição declarativa (eu sou x, ou y, ou z...) representa um fascínio e uma decepção. Fascínio, pois a novidade descoberta irradia no espírito durante algum tempo. Mas a novidade está condenada a deixar de o ser. Aí, o espírito decepciona-se, sente-se cansado, à deriva. Sente-se preso não sabe bem a quê. A prisão, no entanto, não é outra coisa senão a forma da declaratividade.
Uma segunda razão que nos torna incapazes de nos assumirmos como questão está ligada à estrutura do próprio questionar. Este é tomado, no jogo linguístico, como o antecedente de uma resposta. Se digo "eu sou x", pressuponho nesta proposição declarativa o eco de uma questão (quem és tu?). Assim, a forma como nos habituámos a questionar está já dentro do perímetro de segurança da proposição declarativa.
Quando Merton diz que Deus nos colocou uma questão precisamos de perceber a natureza desta questão. Ela não é linguística mas ontológica. A questão que Deus me coloca não é a pergunta "quem és tu?", pertence a outra dimensão. Pelo facto de ser, eu sou já a questão. A praxis linguística tem de facto a capacidade de nos fazer extraviar. Mesmo se substituirmos questão por enigma ou mistério, o hábito conduz-nos a formular esse enigma ou esse mistério de uma forma linguística, que nos arrasta para o domínio da declaratividade.
Mas se eu sou uma questão de natureza extra-linguística, então a resposta que também sou não se pode inscrever no domínio da linguagem. É por isso que as histórias exemplares do Budismo-Zen nos parecem tão bizarras. Merton diz-nos que Deus ao chamar-nos à contemplação responde à questão que colocou. Assim sendo, a resposta à questão que sou é um fazer (uma poiesis), neste caso contemplar, e não um declarar. Este fazer não é, contudo, um mero operar subjectivo sobre as coisas exteriores ou mesmo sobre a nossa suposta natureza interior. É um fazer sem sujeito nem objecto, um puro fluir que vai da nascente para a foz, que não é outra coisa senão a nascente. Mas dizer isto é ainda estar preso na ilusão da declaratividade.
Poemas do viandante
106. SALOMÃO
aquela maré
de frio e naufrágio
ergue-se
pela manhã
cântico vesperal
no declive
que vai de um
ao outro braço
ali salomão
ergueu a tenda
e deixou vaguear
os olhos
entre seixos
e rebanhos
que apascentava
na erva do coração
aquela maré
de frio e naufrágio
ergue-se
pela manhã
cântico vesperal
no declive
que vai de um
ao outro braço
ali salomão
ergueu a tenda
e deixou vaguear
os olhos
entre seixos
e rebanhos
que apascentava
na erva do coração
sábado, 22 de maio de 2010
Poemas do viandante
105. CORAÇÃO DILATADO
a serpente raia o dia
traz um pouco
de cólera
à lavoura
que deixa a terra
sequiosa
da água a vir
nem promessa
nem engano
o coração dilatado
espera
que a porta
se abra
e possa partir
a serpente raia o dia
traz um pouco
de cólera
à lavoura
que deixa a terra
sequiosa
da água a vir
nem promessa
nem engano
o coração dilatado
espera
que a porta
se abra
e possa partir
domingo, 16 de maio de 2010
Poemas do viandante
104. VIAGEM
a viagem
onde te descubro
ao invocar o silêncio
tempestade
de rosas no pólen
da infância
a voz quebra-se
no horizonte
desce
língua de fogo
a arder no sangue
que arde
em mim
a viagem
onde te descubro
ao invocar o silêncio
tempestade
de rosas no pólen
da infância
a voz quebra-se
no horizonte
desce
língua de fogo
a arder no sangue
que arde
em mim
Segurança
O maior perigo vem da busca de segurança. Muitas vezes, na ânsia de fazer proselitismo, o que se oferece às pessoas é a ilusão da segurança, de uma segurança que acaba no outro mundo mas que começa já neste. Mas a vida está longe de ser segura e a verdade nunca trouxe segurança a ninguém. Por que razão a via haveria de ser segura?
sexta-feira, 14 de maio de 2010
Tornar-se em nada
O que está na nossa mão? Nada! Mas este nada não significa nada fazer, indiferença, entrega à fatalidade. Este nada significa o tornarmo-nos no nada que somos e nessa nulidade encontramos O que é. A grande dificuldade é aceitarmos a nossa condição, reconhecermos a indigência da nossa natureza, o carácter precário das nossas pequenas verdades. Tornarmo-nos em nada não é a negação da vida, nem a afirmação do niilismo. É apenas a humilde disposição para que o Ser fale no silêncio dessa nulidade.
Poemas do viandante
103. O GRANDE RIO
uma ilha
na roda da noite
a flor ébria
esquecida
um nome
entre provérbios
e cânticos no azul
desses lábios
aí começa
a peregrinação
o mar incendiado
as escamas
que saltam
os olhos abertos
para o grande rio
de onde tudo parte
uma ilha
na roda da noite
a flor ébria
esquecida
um nome
entre provérbios
e cânticos no azul
desses lábios
aí começa
a peregrinação
o mar incendiado
as escamas
que saltam
os olhos abertos
para o grande rio
de onde tudo parte
quinta-feira, 13 de maio de 2010
A peregrinação errante
Interrogo-me muitas vezes sobre o modo como a Igreja Católica deverá falar aos homens de hoje. Refiro-me aqueles que consumaram em si o processo de modernização iniciado pela Reforma protestante e o Iluminismo. Por exemplo, o esforço de Bento XVI, uma das poucas vozes europeias que tem alguma coisa a dizer, tem sido notável, nomeadamente no campo da cultura, da arte, da filosofia, da dimensão social e política da acção dos homens. Por vezes, porém, sinto que há algo de verdadeiramente essencial que nós homens modernos aspiramos e que não encontramos na Igreja. Para além da questão da cultura e da arte, para além das questões sociais e políticas, para além mesmo das questões do rito e da teologia, é provável que a deriva em que vive o homem moderno esteja a criar um espaço para uma experiência espiritual profunda e radical.
Mais do que em outros momentos da História do Ocidente, a grande experiência do desvario, da alienação, da negação do Espírito, da dissipação da vida, tudo isso que constitui a humanidade ocidental separada já da Igreja (essa humanidade que, com Nietzsche ou na sequência deste, proclamou a morte de Deus), tudo isso, dizia, significa uma experiência desmedida de errância. Esta é o lado oculto da maioridade que os homens atingiram na sequência do Iluminismo. A errância, todavia, significa ainda peregrinação, mesmo que este peregrinar não tenha, ou ainda não tenha, um santuário onde se acolher.
Ora estes peregrinos, que não sabem que o são, são uma cada vez maior fatia das nossas sociedades, e talvez precisem de um outro tipo de linguagem, e de uma nova forma de diálogo. Talvez estejam já suficientemente maduros, embora não o pressintam nem a Igreja o compreenda, para o chamamento do Espírito. Para estes espíritos, aparentemente tão orgulhosos da sua errância, talvez o essencial não seja a questão da dogmática teológica, nem da renovação da perspectiva estética (bem necessária na Igreja, por sinal), nem do diálogo entre a Igreja e a cultura pós-moderna onde nos movemos, nem a problemática social e política (um ponto importante, na verdade). Tudo isso lhes parecerá ocioso. Melhor, tudo isso será sentido como cansativo e destituído de interesse.
Mas não estarão sequiosos que o Espírito fale para lá da Razão? Seja a razão teológica, ou estética, ou ética, ou política. Não estarão sequiosos da intranquilidade da aventura que será o encontro com aquilo que os constitui e os institui? A errância em que vivem não será já uma preparação para a intranquilidade da Via? Não precisará, por isso, a Igreja de encontrar dentro de si gente com profunda experiência e maturidade espiritual e que, a partir dessa experiência madura, possa falar com os homens de hoje, não como um pastor fala ao rebanho nem como um adulto fala a menores de idade, mas como peregrinos experientes na Via falam a outros que a procuram, mesmo que o não saibam? Não precisa a Igreja desses homens e de encontrar com eles outra linguagem?
Maturidade espiritual significará, pelo menos, duas coisas. Por um lado experiência efectiva na Via para a Verdade e para a Vida. Por outro, abandono da segurança da linguagem cristalizada e já morta que perpassa no ritual e na liturgia. Essa linguagem é, muitas vezes, pueril e contraproducente, já incapaz e impotente para conter o mistério e falar dele aos homens de hoje. Certamente que a Igreja Católica atravessa muitos e graves problemas. Mas talvez o mais grave seja o de não conseguir encontrar em si forças espirituais suficientemente maduras, criadoras e seguras para acolher os errantes e sequiosos peregrinos do mundo moderno. Peregrinos esses que muito provavelmente estarão pouco abertos para questões de dogmática e muito para experimentarem o Caminho.
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Poemas do viandante
102. TRAIÇÃO
germina um canto
na solidão da noite
a imagem trazida num livro
onde recolho orações
sonhos transviados
a promessa esquecida
cavalo na estepe
o coração entrega-se
ao tempo inicial
lugar onde rememoro
cada metáfora
onde te traí
germina um canto
na solidão da noite
a imagem trazida num livro
onde recolho orações
sonhos transviados
a promessa esquecida
cavalo na estepe
o coração entrega-se
ao tempo inicial
lugar onde rememoro
cada metáfora
onde te traí
terça-feira, 11 de maio de 2010
Poemas do viandante
101. DANÇAR A POLCA
o disforme oráculo caminha
traz nas mãos a erva
do destino
duas pedras e uma rosa
que penduras no calendário
para que serve dançar a polca
a herança trazida da boémia
se a língua se prende
nas palavras que o silêncio
te sopra
o disforme oráculo caminha
traz nas mãos a erva
do destino
duas pedras e uma rosa
que penduras no calendário
para que serve dançar a polca
a herança trazida da boémia
se a língua se prende
nas palavras que o silêncio
te sopra
quarta-feira, 5 de maio de 2010
Poemas do viandante
100. A NOITE
a noite cobre-se
de seda e vem
negra e esplêndida
com asas de gavião
poisa no ramo
dos teus olhos
e apaga a luz
dos meus
a noite cobre-se
de seda e vem
negra e esplêndida
com asas de gavião
poisa no ramo
dos teus olhos
e apaga a luz
dos meus
terça-feira, 4 de maio de 2010
Poemas do viandante
99. TEMPESTADE
a tempestade zinca
a cidade
abre sulcos de fogo
na planície de cinza
faz cantar as nuvens
sobre as cabeças
sonâmbulas
de quem passa
a tempestade zinca
a cidade
abre sulcos de fogo
na planície de cinza
faz cantar as nuvens
sobre as cabeças
sonâmbulas
de quem passa
sábado, 1 de maio de 2010
Poemas do viandante
98. ESPERA
a viagem
essa hora aprazada
inunda-me
de poeira
aí te espero
como num alpendre
destelhado
olhos fechados
um incêndio
prestes a florir
a viagem
essa hora aprazada
inunda-me
de poeira
aí te espero
como num alpendre
destelhado
olhos fechados
um incêndio
prestes a florir
quarta-feira, 28 de abril de 2010
Poemas do viandante
97. ÁRVORES
começaram a florir
as lentas árvores da cidade
rebanho perdido
nestes dias
que maio chama
para a rápida morte
ainda nada está decidido
estendem para o céu
as pobres árvores
os ramos
dedos cansados
de tanto florir
cobertas de folhas
esperam o Outono
o frio que te há-de
despir
começaram a florir
as lentas árvores da cidade
rebanho perdido
nestes dias
que maio chama
para a rápida morte
ainda nada está decidido
estendem para o céu
as pobres árvores
os ramos
dedos cansados
de tanto florir
cobertas de folhas
esperam o Outono
o frio que te há-de
despir
segunda-feira, 26 de abril de 2010
Poemas do viandante
96. FLORESTA
a floresta tardia
veste-se de
natureza caligráfica
arvora letras
sílabas indecisas
as primeiras palavras
com que o vento
então falava
a floresta tardia
veste-se de
natureza caligráfica
arvora letras
sílabas indecisas
as primeiras palavras
com que o vento
então falava
domingo, 25 de abril de 2010
Poemas do viandante
95. ESPLENDOR E CINZA
no jardim virado ao pretérito
traço a rua por onde
imóvel
caminhas
vens
sem vestes luminosas
esplendor e cinza
dos meus olhos
no jardim virado ao pretérito
traço a rua por onde
imóvel
caminhas
vens
sem vestes luminosas
esplendor e cinza
dos meus olhos
sábado, 24 de abril de 2010
Poemas do viandante
94. OS QUATRO ELEMENTOS: TERRA
montes sobre a planície
a ilha a que chamas
presente
poeira lançada sobre o muro
daquela casa
que é uma lezíria
assim tão sólida
recorda campos baldios
à espera que mendigos cheguem
e de joelhos
estendam a ferida mão
sobre a poeira da terra
montes sobre a planície
a ilha a que chamas
presente
poeira lançada sobre o muro
daquela casa
que é uma lezíria
assim tão sólida
recorda campos baldios
à espera que mendigos cheguem
e de joelhos
estendam a ferida mão
sobre a poeira da terra
sexta-feira, 23 de abril de 2010
Poemas do viandante
93. OS QUATRO ELEMENTOS: ÁGUA
uma orquídea
o rumor de algum pássaro
a pele suada
à luz da tarde
deixo cair a mão
sobre a névoa do meio-dia
e afogo-me na água
onde tudo arde
uma orquídea
o rumor de algum pássaro
a pele suada
à luz da tarde
deixo cair a mão
sobre a névoa do meio-dia
e afogo-me na água
onde tudo arde
quinta-feira, 22 de abril de 2010
Poemas do viandante
92. OS QUATRO ELEMENTOS: AR
nem sempre é naufrágio
o que derrota os barcos
e devolve o marinheiro a terra
nem sempre é medo
o que cala o solitário
e na escuridão o encerra
há ainda o vento
sopra onde quer
e para aqui ou ali te leva
nem sempre é naufrágio
o que derrota os barcos
e devolve o marinheiro a terra
nem sempre é medo
o que cala o solitário
e na escuridão o encerra
há ainda o vento
sopra onde quer
e para aqui ou ali te leva
quarta-feira, 21 de abril de 2010
Poemas do viandante
91. OS QUATRO ELEMENTOS: FOGO
o lume arde
nesses dedos
cobertos de seda
vestidos de cambraia
o lume é uma máquina
decepa as mãos
na vindima ardente
de uma ilusão
sonhos são sedas
e cambraias a arder
nos dedos mecânicos
da decepada mão
lume
o sonâmbulo sonho
onde te escuto
sob a copa desta faia
o lume arde
nesses dedos
cobertos de seda
vestidos de cambraia
o lume é uma máquina
decepa as mãos
na vindima ardente
de uma ilusão
sonhos são sedas
e cambraias a arder
nos dedos mecânicos
da decepada mão
lume
o sonâmbulo sonho
onde te escuto
sob a copa desta faia
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