terça-feira, 27 de janeiro de 2015

Sobre a arte

Willian M. Harnett - Music and Literature (1878)

Em Hegel a arte - a arte dos gregos - ainda era vista como uma manifestação sensível do Absoluto. Nos dias de hoje, na sociedade de mercado, a arte é um bem económico e julgada socialmente pelo seu valor no comércio, independentemente da crença de cada um sobre o valor e os serviços que a arte possui e presta. Para o artista, contudo, a arte é a sua viagem no caminho do espírito, a resposta que dá à voz que o chamou, Não é uma manifestação sensível do Absoluto, mas o mapa que alguém traça da sua viagem ao encontro desse Absoluto.

segunda-feira, 26 de janeiro de 2015

O mistério da noite

Alphonse Osbert - O mistério da noite (1897)

As sociedades modernas dividiram a noite segundo uma tripla possibilidade. A noite como o tempo de descanso, como o tempo da diversão e como o tempo de trabalho. Esta tripla consideração do tempo nocturno tem por função matar o mistério da noite, impedir que ele simbolize para o homem alguma coisa de essencial. O mistério da noite reside na possibilidade que nela a luz se manifesta com mais intensidade. O mistério da noite é o da vitória luz sobre as trevas.

domingo, 25 de janeiro de 2015

Divergência e convergência.

Jackson Pollock - Convergence (1952)

É hábito considerar o pensamento divergente como sintoma de criatividade. Toda a divergência é, antes do mais, um afastamento, uma separação do instituído, daquilo que o mundo e o senso comum aprovam como aceitável. Afastamento esse que é, ao mesmo tempo, uma convergência com o inesperado, o inusitado, com a voz única que do fundo do ser chama por aqueles que ousam divergir do mundo.

sábado, 24 de janeiro de 2015

De porto em porto

Paul Signac - Port of La Rochelle (1921)

O porto simboliza um momento especial da viagem. Marca a chegada a um certo patamar de compreensão e de luz. Ao mesmo tempo indica uma nova necessidade de partir, de entrar no não conhecido e no não luminoso. A tranquilidade de chegar a bom termo indica sempre a ânsia de procurar uma nova luz.

sexta-feira, 23 de janeiro de 2015

Haikai do Viandante (219)

Godofredo Ortega Muñoz - Aguirri Pirineos (1926)

sob a neve
a pedra fria e dura
nela a vida cresce

quinta-feira, 22 de janeiro de 2015

A sedução do entretenimento

Gustavo - Circo turístico (1975)

O risco maior para quem recebeu a dádiva da vida é fazer dela uma viagem turística ao circo, tornar a sua existência numa relação distraída e superficial com a vida, o mundo e os outros. A sedução do entretenimento não é apenas o resultado da acção eficiente da indústria cultural. Ela é um perigo que espreita os mais elevados e insuspeitos domínios espirituais, uma forma de fazer da vida do espírito um passatempo de um eu exausto e fechado sobre si.

quarta-feira, 21 de janeiro de 2015

Poemas do Viandante (493)

Kazimir Malevich - House with a Fence (1910-11)

493. o silencioso segredo

o silencioso segredo
desses lábios

murmura uma canção
aos meus ouvidos

e eu oiço-te no silêncio
da minha casa

terça-feira, 20 de janeiro de 2015

O desejo do além

Paul Ackerman - L'au-delà est désirable

A crítica popular à crença no além esquece o facto desse além ser o objecto que move o desejo. Ao desejar qualquer coisa o homem põe diante de si, como objecto desejável, algo que está para além dele, uma transcendência. O além é o sinal da nossa impossibilidade de coincidirmos com o aqui e o agora factuais, com as condições que a existência terrena nos propõe. O além chama-nos e move-nos pela sua natureza desejável e que tem o poder de desencadear o desejo. Seria um equívoco encerrarmos o além num mero devaneio da imaginação, numa ilusão de óptica movida pelo medo.

segunda-feira, 19 de janeiro de 2015

Ardente obscuridade

Juan José Aquerreta - Ardente oscuridad (1991)

A noite escura e o amor ardente. Estes são os sinais de avanço na viagem. Que sinais anunciam ao viandante o progresso no caminho que é o seu? Quanto mais escura for a noite, quanto menor for a luz do mundo, e quanto mais ardente for o amor, então o viandante pode suspeitar que não se desviou do caminho.

domingo, 18 de janeiro de 2015

Um lugar de solidão

Albano Vitturi - Gli eremiti di Faida (1934)

A nossa sociedade é fértil em contradições. Nenhuma outra terá exterminado com tanta determinação a possibilidade dos homens encontrarem um lugar de solidão, um eremitério onde se possam confrontar consigo e com a vida. Mas nenhuma outra terá precisado tanto que homens e mulheres se encontrem perante si próprios, se confrontem com a vida, tenham um lugar de solidão e abandono.