Vincent Van Gogh, Ángel, 1889 |
Na
poeira de ébano desta terra, reina anjo avaro,
armadura
branca presa na pálida luz da palavra,
olhos
de pérola atalaiam as ruas da cidade,
o
tormento do calor na sombra coagulada,
estátua
de sal, mãos de seda, pó de penumbra.
Ouve-se
a brancura da voz na força da tarde,
o
poder de quem tem a chave de todas as chaves,
o
silêncio nascido na textura de cada dia.
Eis
o segredo animal a dançar na pólvora das horas,
promessa
de luz, sangue vazado no joio da vida.
Nas
praças perdem-se homens de exíguo poder.
A
carne levita-lhes na gravidade azul do desejo,
o
espírito prostrado ante a porta sempre aberta
para
a incandescência estelar das searas
crestadas
pelo peso do Sol no rio do abandono.
Com
esta chave abrirás o segredo dos mares,
o
rumor das palavras esquivas nas folhas de jornal,
as
mãos perdidas por entre musgos e relvas,
um
dedo ferido na porta empurrada pelo vento,
tempestades
trazidas na voracidade da tua voz.
Com
esta chave fecharás a luz na sombra do mar,
os
dedos cobertas de nódulos, feridas, a cinza
do
êxtase presa nas muralhas de cristal,
a
devassidão com que os passos empurram
homens
de pedra para o relâmpago da tempestade.
1993
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