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quinta-feira, 17 de novembro de 2016

Acerca da definição

Albert Porta - Book of Definitions (1978)

Uma das inclinações mais notáveis do espírito humano é a de se entregar ao trabalho da definição. Definir significa antes de mais limitar. Assinalado um território assim limitado, passa-se ao processo da sua caracterização para lhe dar um sentido. Contudo, nesta tarefa que está na base da filosofia e da ciência há um tal estreitamento do horizonte que o mesmo espírito sente toda a definição como um produto estranho e, em última análise, ameaçador. É por isso que a vida espiritual é uma revolta contínua contra a definição, uma guerra sem parar do espírito consigo mesmo, contra aquilo que nele é tendência mórbida e inelutável para a limitação.

domingo, 27 de março de 2016

A ressurreição

El Greco - Ressureição (1605-1610)

A pintura de El Greco permite perceber uma dimensão da ressurreição do Cristo para além das leituras literais correntes. O que se vê é a elevação de Cristo acima das contingências temporais e mundanas, as quais estão representadas pela confusão e pelo espanto que se apodera dos restantes figurantes da cena. Ressuscitar é então um elevar-se acima das condições do espaço e do tempo, às quais estamos submetidos e são o limite das nossas possibilidades. A ressurreição de Cristo surge como um desafio aos limites e uma ultrapassagem das condições mundanas do homem.

terça-feira, 12 de maio de 2015

Convite à passagem

JCM - Muros (Lugo), 2007

Aquilo que detém o corpo é impotente para deter o espírito. O obstáculo não é um limite mas uma provação que solicita a que o espírito, escorado na sua pobreza e na abertura ao que está para além dele, o ultrapasse e se ultrapasse. O muro não é o fim da viagem mas um convite à passagem.

segunda-feira, 5 de agosto de 2013

Da condição do Homem

Vincent Van Gogh - Naturaleza muerta con pan (1887)

Então eles lhe disseram: Não temos aqui senão cinco pães e dois peixes. (Mateus, 14:17)

Poderemos a partir desta citação de Mateus pensar a condição humana sobre a Terra? A questão central não será, nesse caso, os pães e os peixes, mas o senão. Ele remete-nos para o limite do que possuímos, para o limite dos nossos poderes, para a limitação do nosso ser. Neste senão ou num qualquer apenas expressa-se a natureza humana na sua finitude. Seja o que for o que possuirmos será sempre apenas isso. O que está para além disso é infinitamente mais e incomensurável com o nosso próprio ser. Mas este limite dado pela finitude é a única condição de possibilidade que o homem possui para ir além desse limite. Esta condição de possibilidade reside no reconhecimento da verdadeira situação humana. Só esse reconhecimento permite que algo desça sobre o homem e o multiplique, tal como a bênção do Cristo multiplicou pães e peixes.

quarta-feira, 18 de abril de 2012

A canção da carne

Max Ernst - La chanson de la chair

Talvez o enigma da carne resida na sua íntima conexão com o tempo. É através dela que entramos no reino da temporalidade. Por exemplo, a experiência da rotação entre dia e noite ou a revolução das estações com o seu eterno retorno ainda não representam por si a experiência do tempo. A experiência directa do tempo nasce da progressiva consciência das metamorfoses da carne. São estas transformações que arrastam o espírito e o prendem no fascínio temporal. Trata-se de um verdadeira queda. A intemporalidade espiritual é arrastada pela carne para a finitude e a mutação. Mas não seria mais sensato falar de corpo em vez de carne? Não. Apesar do corpo, do meu corpo, ser carnal é possível separar um do outro. Pelo corpo, experimento o espaço e o limite da minha figura; pela, carne percebo o tempo e, como disse, a finitude. É através dela que tenho acesso ao fluxo da vida. É este fluxo, onde o espírito caiu, que é uma elegia, a verdadeira canção da carne.