domingo, 8 de outubro de 2023

No limiar (11)

José Manuel Espiga Pinto, Mapa marcado com rasgão para entrada na sala de projecções simultâneas, 1973 (aqui)

O mundo coagulado oferece-se, como uma vítima no holocausto, ao cutelo do mapa. Este suspende a realidade do território, mantém-na num estado onírico, roubando-lhe a consistência, despindo-o dos acidentes e das linhas de fractura ou dos pontos de encontro, onde se reúnem a água de rios e lagos, a terra de lezírias e charnecas, os ares vindos das montanhas ou fugidos das tempestades oceânicas. Um mapa é como uma droga alucinogénica, cria imagens a que nada corresponde, apaga o que existe na quimera cintilante do que não existe. Espera a benevolência do fogo para, reduzido a cinzas, deixar emergir do nada a realidade viva.

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