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quarta-feira, 3 de dezembro de 2014

Nos caminhos que se cruzam

JCM - Black & White Dreams (2014)

Imaginar a viagem como um exercício infinito de escolha entre caminhos que se cruzam. Uma viagem sem mapa, sem roteiro, sem bússola. O viandante, despido de todos os dispositivos de orientação, entrega-se  à pura disposição da graça, como se cada escolha fosse, ao mesmo tempo, a realização da mais pura liberdade e o cumprimento de uma insuperável necessidade.

sexta-feira, 28 de novembro de 2014

A memória da errância

JCM - Time on space (2007)

O tempo que se inscreve na pele, abrindo sulcos na planície do corpo, é um sinal - quase diria, uma memória - da errância que constitui parte substancial da viagem. Muitas vezes a luz que ilumina o espírito ausenta-se, coberta por uma nuvem. Então, o viandante perde-se no caminho, avança e recua, traça linhas sinuosas que não levam a lado nenhum. E tudo isso se inscreve nesse inusitado mapa que é a pele. Mais do que as vitórias, são os enganos, as ilusões e as derrotas que nos sulcam o corpo.

quinta-feira, 27 de novembro de 2014

À volta da linha

Wassily Kandinsky - À volta da linha (1943)

Podemos imaginar a viagem espiritual como um processo no qual seguimos uma certa linha, aquele recto caminho que nos foi dado. Essa imagem não sendo completamente ilusória é, todavia, incompleta. A viagem é também o esforço - há quem diga a ascese - de retornar da errância à volta da linha para o recto caminho, o qual e apesar de nos ter sido dado só existe nesse esforço criador que nos aproxima dele, inventando-o a cada aproximação.

terça-feira, 25 de novembro de 2014

Do florescer

Kenneth Noland - Florescer (1960)

A viagem espiritual está longe de se deixar descrever pela metáfora dialéctica em da transformação do botão em flor, de um botão que contém em potência o flor em que se transformará. Devemos imaginá-la antes como uma outra forma de florescimento, no qual a flor se vai tornando, na viagem, cada vem mais naquilo que é, vai sendo cada vez mais flor.

segunda-feira, 24 de novembro de 2014

A tempestade

Gustavo Torner - Como a tempestade (1959)

Temos medo de pensar em tempestades, não vá esse pensamento atraí-las. O caminho do viandante, porém, não está isento delas. Tarde ou cedo elas acabam por chegar para moldar o espírito e abrir uma via que, talvez sem se saber, estava fechada. Tudo o que acontece na viagem, tempestade ou bonança, faz parte da aprendizagem da via, queiramos ou não.

quinta-feira, 20 de novembro de 2014

Da multiplicidade das paisagens

Giorgio Morandi - Paisagem (1913)

Uma ilusão comum reside na convicção de que, na viagem, o viandante encontra múltiplas e diferentes paisagens, às quais, para sobreviver e prosseguir o caminho, terá de se adaptar. A ilusão não está na convicção da existência dessa multiplicidade, mas no facto de ela ocultar que o viandante traz em si, também ele, uma multiplicidade de paisagens que vai projectando no caminho, num jogo de revelação, no qual ele descobre aquilo que lhe pertence.

domingo, 16 de novembro de 2014

Do papel do equívoco

Jean Dubuffet - Banco de equívocos (1963)

Quantas vezes a vida não é senão um banco de equívocos, de erros, de mal-entendidos? Perante isso, há a tendência para ver a fonte do mal nas capacidades interpretativas do sujeito. É ele que se engana, que interpreta mal as vozes que o chamam, que se deixa enredas nas teias do erro. E no entanto a palavra equívoco tem, na sua raiz, um outro ensinamento. Pode-se dizer que a ambiguidade presente no equívoco está na igualdade (āequus) das vozes que chamam (vocāre) o homem. É a própria realidade que o enreda e o leva à perda. Mas se assim é, poderá ainda a perda ser considerada uma perda? Não será antes um caminho de aprendizagem?

quarta-feira, 12 de novembro de 2014

O acesso

Al Held - Acesso (1967)

Quando nos perguntamos pelo acesso ao caminho tornamos esse acesso obscuro e enigmático. Mas o acesso ao caminho que nos cabe não é obscuro nem tem a natureza dos enigmas. Ele não é longínquo nem de uma realidade que nos transcende ou que pertença a outro tempo. O acesso está aqui e agora, está na mão que abrimos, nos olhos com que vemos, no coração que pulsa, na respiração que nos traz a vida.

quinta-feira, 16 de outubro de 2014

Uma composição

Alexander Mikhailovich - Composição (1943)

Muitas vezes o viandante julga perder-se no caminho. Entra numa senda, depois noutra e ainda noutra. O espírito é tomado pelo pânico que todo o labirinto traz consigo. Tudo isso não passa, porém, de uma questão de perspectiva. Vistos de perto, esses caminhos que se cruzam e bifurcam parecem, de facto, constituir um labirinto, mas se o viandante se dispõe a subir a montanha tudo se apazigua e, com o progresso da subida, começa a ganhar sentido, como se fosse uma deliberada composição.

domingo, 12 de outubro de 2014

Perdido no nevoeiro

JCM - Mitologias (presenças) (2014)

Perdido no nevoeiro, o viandante sente presenças reais, mas não consegue determinar-lhes os contornos nem descobrir o caminho que seguem. E ele não é diferente dessas presenças. Dias após dia, ano após ano, caminha, mas raramente o nevoeiro se levanta e o caminho se mostra nítido e luminoso. Viver no nevoeiro é o seu estranho destino. Sente presenças reais à sua volta e aspira a que, um dia, a luz rompa a densa muralha da névoa.

domingo, 17 de agosto de 2014

Na densa névoa

JCM - Mitologias (o dia de  retorno de D. Sebastião) (2008)

Subir a escarpada montanha e adentrar-se na densa névoa, rasgar um caminho - o seu caminho - na pedra inóspita e velada pelos céus. Esta é a viagem do viandante. Move-o o puro caminhar, pois em cada passo há uma luz que se abre e o orienta - como se, estando ela ali, o chamasse de longe - na densa névoa que é a vida dos homens na Terra.

sexta-feira, 15 de agosto de 2014

Lugar nenhum

JCM - Chemins qui ne mènent nulle part (2008)

Nunca meditamos suficientemente o verso de Rilke. Caminhos que levam a parte alguma são ainda caminhos? Não deverá qualquer caminho levar-nos a um lugar determinado, a um destino prévio e já constituído? O que significa então esse nenhum lado? Significa a indeterminação, em primeiro lugar. Significa, depois, que esse lugar para onde se caminha não existe, ele apenas poderá emergir do próprio caminhar. Na vida do espírito não são os lugares que determinam caminhos para ligação entre eles. É o caminhar que abre o caminho e o lugar. É a viagem que aflora a clareira e a determina, para logo a abandonar. O viandante caminha pois não pertence a qualquer lugar.

domingo, 3 de agosto de 2014

A cura dos enfermos

Pablo Picasso - La malade

E, Jesus, saindo, viu uma grande multidão, e possuído de íntima compaixão para com ela, curou os seus enfermos. (Mateus 14,14)

Duas perplexidades surgem ao leitor perante este texto de Mateus. A primeira leva-o a perguntar: por que razão uma grande multidão leva ao desencadear da compaixão, de uma íntima compaixão? A segunda diz respeito aos enfermos que nela estavam e que foram curados. Quem são eles, esses enfermos? A primeira perplexidade encontra resposta no versículo anterior. Essa grande multidão é composta por aqueles que O seguiram desde as cidades. A compaixão denota a compreensão do esforço - da ascese - que representa seguir o Mestre. Segui-Lo emerge, deste modo, como um processo contra-natura, um exercício que exige sacrifício. Mas quem são os enfermos? São aqueles que, mesmo ao segui-Lo, caem na errância, perdem o alvo. Fazem o caminho mas não sabem o sentido desse caminho. Reproduzem o gesto ritual, mas este é já destituído de verdadeira vida. Por isso é dito que estão doentes. São esses os enfermos que a compaixão leva à cura, isto é, à revelação do sentido do caminho que estão a fazer.

sábado, 2 de agosto de 2014

Folhas mortas

JCM - Folhas mortas (2014)

Exaustas, as folhas entregam-se à morte. Não porque a morte tenha triunfado, mas para que a vida volte de novo e, na exuberância e frescura do verde, se torne símbolo que oriente o viandante no caminho. Sempre que este se depara com folhas mortas é a vida plena e triunfante que espera.

domingo, 27 de julho de 2014

À volta de um ponto

Frantisek Kupka - Alrededor de un punto (1911-12)

Por vezes, o viandante volteia uma e outra e outra vez em torno de um ponto. Sinal de que está perdido? De certa maneira, sim. Fundamentalmente, porém, sinal de que, tomado pela errância, procura já o caminho que o leva ao que chama por ele.

quarta-feira, 23 de julho de 2014

Um traço de luz

JCM - Origem da Vida (2014)

Um traço de luz irrompe nas trevas e, lentamente, dissemina-se na planície da noite. Onde tudo parece ausência, lentos grãos de vida brotam da escuridão. Sementes carregadas de esperança anunciam a via, a verdade e a vida.

sexta-feira, 11 de julho de 2014

Na solidão da paisagem


Na paisagem escarpada, no território acidentado, encontra o viandante o difícil caminho que o espera. Por vezes, chama-o a luz; outras, é o segredo da terra que o aguarda. Entre a luz e as trevas, terá de abrir a via, aquela que apenas ele, na solidão da paisagem, poderá trilhar.

quarta-feira, 9 de julho de 2014

Espelho de água

Imogen Cunningham - Eiko’s Hands (1971)

Na água pura reflecte-se, como num espelho, a leveza das mãos, o ócio que nelas nasce e o trabalho que delas se espera. Nesse espelho de água inscreve-se o caminho que aguarda o viandante, um caminho secreto e transparente, fluido e sólido. Assim se apresenta o espírito quando chama o homem.

terça-feira, 8 de julho de 2014

Da natureza da esperança

Bill Perlmutter - Nazaré, Portugal (1956)

Há sempre esse momento de espera, uma suspensão para que os olhos se abram para a desmedida do horizonte e tracem novas rotas ou encontrem aquilo que, tão esperançosamente, aguardam. A esperança não é outras coisa senão o olhar que se projecta para o caminho que nos solicita ou para aquilo que nos aguarda.

quarta-feira, 2 de julho de 2014

Da vida do espírito

Ralph Gibson - Untitled, (from The Somnambulist) (1970)

Em todos os símbolos há uma ambiguidade essencial, como se o símbolo possuísse uma carga semântica tal que simbolizasse, ao mesmo tempo, coisas contrárias. A porta é um dos símbolos mais ricos do imaginário dos homens. Nela existe também essa carga simbólica contraditória. É o símbolo da saída e também o da entrada. A razão analítica apresenta entrada e saída como contrárias, mas a experiência imemorial dos homens diz-lhes que toda a saída é uma entrada e toda a entrada implica uma saída. Ora a viagem do homem é o contínuo deslocar-se nessas encruzilhadas de entradas e de saídas, como se a viagem do espírito fosse infinita. Nunca se entra num patamar que não seja para dele sair. Nunca se sai de outro patamar que não seja para entrar no próximo.