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terça-feira, 6 de outubro de 2015

No magma umbroso

Fernando Lerín - Sem título (1985)

No magma umbroso da vida estão contidos todos os possíveis. O lento e doloroso trabalho do espírito acabará por retirar uma e outra figura (um deus, um poema, um quadro, um rapto místico, uma sinfonia), num processo secreto, inesperado, que traz consigo a luz que iluminará por instantes o caminho do viandante.

quinta-feira, 24 de setembro de 2015

Sobre a discussão

Emil Hansen - Discussion (Blue)

No mundo ocidental, a valorização da discussão - sob a denominação de discussão crítica - oculta duas coisas essenciais. O culta o seu real valor e a sua impotência na vida do espírito. O real valor da discussão é o da substituição da violência física pela confrontação simbólica. Esta substituição, contudo, é uma necessidade social e nada tem a ver com o caminho para a verdade. Os limites da discussão estão na sua própria natureza. A confrontação simbólica através de palavras é ainda uma paixão, onde os egos se afirmam e se defendem. O caminho do espírito começa, todavia, quando o ego se cala e abandona o palco onde representa o seu triste papel.

segunda-feira, 24 de agosto de 2015

Ficar e partir

Umberto Boccioni - Estados de Alma I - os que partem (1911)

Na vida social dos homens há uma grande diferença entre os que ficam e os que partem. Ficar ou partir são formas diferentes de projectar a vida e podem mesmo constituir um traço de carácter. Na vida do espírito, contudo, é indiferente ficar ou partir, pois há que aprender a ficar como se tivesse partido, e aprender a partir como se tivesse ficado.

domingo, 23 de agosto de 2015

Caminhos áridos

Remedios Varo - Caminho árido (1962)

Na vida do espírito, seja qual for a área onde se desenvolva a vida espiritual (religião, arte, ciência, filosofia), os caminhos áridos, marcados pela impotência criativa, são centrais na viagem. A aridez devolve o espírito à sua humildade, mostra-lhe a sua finitude, mostra-o dentro dos limites que são os seus. Estes exercícios forçados de humildade são, porém, momentos preciosos. Preparam uma nova etapa de criação e de atenção ao que é essencial, de capacidade para escutar a voz que chama.

domingo, 16 de agosto de 2015

Visões outonais

Alson Skinner Clark - Claridade de Outono

Na simbólica das estações do ano, o Outono surge como o tempo do declínio. O grande fulgor, simbolizado pelo Estio, já passou, mas a vida ainda não entrou no frio e negro Inverno, presságio da morte. A vida espiritual, contudo, encontra no Outono uma outra simbolização. A claridade do Outono, de onde desapareceram os efeitos dos ardores primaveris e da efervescência estival, é a mais propícia ao caminho e a que permite ver mais fundo e melhor. Não há visões como as trazidas pelo Outono.

sexta-feira, 10 de julho de 2015

O ritual da procissão

Ignacio Pinazo - Procesión del Corpus en Godella (1888)

A procissão, refiro-me àquela que tem um carácter religioso, é um momento ritual de culto religioso, marcado pela solenidade do acontecimento. Se nos ativermos, porém, a uma perspectiva tradicionalista da vida, talvez possamos descobrir uma outra coisa, a qual acabou por se tornar desconhecida para um homem de educação moderna. O caminhar solene da procissão não é apenas uma mera cerimónia religiosa, mas a simbolização da vida. A vida na sua inteireza, desde o nascimento até à morte é compreendida pelo homem de mentalidade tradicional e religiosa como um caminho, o qual, em todas as suas etapas, deve ser percorrido com a solenidade que os crentes ostentam no ritual da procissão. Nela, na procissão, é a vida que se representa, se extrai da banalidade do quotidiano e ganha um sentido que ultrapassa o mero facto de se estar vivo.

quarta-feira, 22 de abril de 2015

Levado pelo vento

Darío de Regoyos y Valdés - Una calle de Córdoba

Uma rua que de súbito se fecha e se torna em mistério. São assim os caminhos do viandante, ir por ruas que se fecham num enigma. Penetrar no mistério que se abre como uma avenida. Assim caminha, de mistério em mistério, de rua em rua, levado pelo vento que sopra onde quer.

terça-feira, 14 de abril de 2015

Paisagens desconhecidas

Jean Metzinger - Landscape (1904)

O estranho silêncio das paisagens desconhecidas abre-se perante o espanto do viandante. E ele não sabe o que mais admirar, se a novidade com que os seus olhos se deparam ou se o silêncio com que é recebido. E assim penetra no desconhecido à espera de um sinal que lhe indique o caminho ou de uma voz que o chame.

sábado, 11 de abril de 2015

Ofícios e profissões

Joaquín Mir - Carpinteiro

O que distingue um antigo ofício de um profissão moderna? Esta ou é meramente rotineira ou exige conhecimento técnico; por vezes, ambas as coisas. Nela, porém, tudo se reduz à eficácia, nada mais possibilitando ao homem do que um contacto superficial e, muitas vezes, patológico com o mundo material. Os antigos ofícios continham neles uma possibilidade que se nos tornou estranha. Pelo afeiçoamento da matéria, pela excelência e virtuosismo dos actos, o artesão tinha a possibilidade de encontrar no seu quotidiano o caminho onde poderia realizar a viagem espiritual. Um ofício era um caminho possível para o espírito, uma profissão é uma corrida sem destino nem proveito para a alma.

sábado, 4 de abril de 2015

A experiência da via

Stipo Pranyko - Altar para um agnóstico (1996)

Eu sou a via, e a verdade e a vida. Ninguém vem ao Pai, senão por mim. (João 14:6)

A vida espiritual confronta-se sempre com o agnosticismo. Este mais não é do que a confissão de um não saber, de ausência de conhecimento. Muito antes de João ter escrito as palavras de Cristo em epígrafe, Platão definiu o conhecimento como crença verdadeira justificada. A vida espiritual sofreria, então, de uma limitação que a colocaria na classe das crenças dogmáticas, às quais falta justificação. Não será por isso um conhecimento, uma gnose, o que, na verdade e de forma surpreendente, torna os crentes em agnósticos. Porém, há uma justificação que desfaz o hipotético dogmatismo e o concomitante agnosticismo. A crença na verdade e na vida justifica-se não por uma adesão irracional e incompreensível mas pela experiência da via, do caminho. A experiência é a mais radical justificação que uma crença pode obter. Assim sendo, a fé, como nos ensina a palavra latina fides, não é outra coisa do que o compromisso com a via, a fidelidade à própria experiência.

quarta-feira, 1 de abril de 2015

De floração em floração

Adolfo Guiard - Árbol en flor

Também as árvores têm o seu caminho. De floração em floração, elas respondem ao apelo que a natureza inscreveu no seu ser. Também o viandante se confronta com o eterno retorno e pergunta-se, a cada nova primavera, se também ele responde ainda ao apelo que o chamou à vida.

terça-feira, 17 de março de 2015

O caminho oblíquo

Albert Gleizes - O caminho, Meudon (1911)

Por mais que deseje um caminho claro e distinto, o viandante acabará por descobrir que o seu desejo será sempre frustrado. Não há caminho espiritual que seja a execução de um conjunto de imperativos racionais, que o farão viajar por um espaço geométrico determinado pela limpidez da razão. A cada momento, o caminho varia, apresenta obstáculos, impõe retornos, logo seguidos de avanços, perde a luz que o ilumina, para que o viandante logo a descubra quando as trevas se tornarem mais intensas. Será sempre oblíquo o caminho do homem em direcção à voz que o chama.

terça-feira, 10 de fevereiro de 2015

Viver os contrastes

Sonia Delaunay - Contrastes simultâneos (1913)

No século XIV Nicolau de Cusa pensou a coincidência dos opostos. Para o viandante, porém, o problema tem uma dimensão prática. Não se trata de pensar a possibilidade do pequeno coincidir com o grande, por exemplo. Trata-se de viver simultaneamente os contrastes que a vida que lhe coloca. Encontrar o silêncio no cento do ruído, descobrir a tranquilidade no meio da agitação, ver a luz dentro das trevas.

segunda-feira, 9 de fevereiro de 2015

De negro em negro

Wassily Kandinsky - Mancha Negra I (1912)

Por vezes o negro é sintoma de que o espírito se perdeu no caminho, se entregou à errância e que já não consegue descortinar a estreita senda que o levaria a bom porto. Outras vezes, porém, o negro - a noite escura - é apenas a antecâmara da chegada da luz. O mais importante não é distinguir uma negridão da outra, mas aprender a transformar a primeira na segunda.

terça-feira, 3 de fevereiro de 2015

Um convite à sabedoria

Charles Lapicque - L'invitation à la sagesse (1961)

Ao olhar para a vida, é-se atraído ou pela consideração de que a vida dos homens é destituída de qualquer sentido ou pela ideia contrária, de que existem múltiplos sentidos em conformidade com a natureza de cada um. O caminho do viandante, porém, permite-lhe perceber a unidade que se opõe à ausência e que contém em si os múltiplos sentidos . A vida é um convite à sabedoria, à sageza, e esse é o sentido que unifica todos os sentidos possíveis.

sexta-feira, 30 de janeiro de 2015

Criador de formas

Frantisek Kupka - A forma do azul (1931)

Muitas são as formas que se deparam ao viandante no caminho que faz. Num primeiro tempo, fica fascinado com a multiplicidade que o mundo exterior lhe apresenta. Num segundo tempo, cresce nele a dúvida sobre a origem daquelas formas. Seriam mesmo formas exteriores? Por fim, avançado na idade, o viandante descobre que tudo o que vê é a projecção daquele que vê. O bem e o mal, o branco e o azul, o sólido e o líquido, todas as formas têm a forma do seu olhar, da pureza ou da imundície que lhe habita o espírito. O viandante é um criador de formas, que o afastam ou o aproximam do que não tem tem forma.

sexta-feira, 2 de janeiro de 2015

O frio invernoso

George Wesley Bellows - A Morning Snow - Hudson River (1910)

Nos ciclos da vida espiritual não é importante apenas a sua natureza cíclica, o facto de uma estação antecipar já a próxima, como se a vida fosse uma deriva em espiral. Em cada estação - como nas estações da via crucis - há que permanecer na natureza que a constitui e abrir-se à experiência a que ela convoca. Também o frio invernoso faz parte do caminho do viandante, nessa aproximação infinita à voz que o chama.

sexta-feira, 19 de dezembro de 2014

Um caminho de vida

Salvador Dali - Cavaleiros do Apocalipse (1970)

Há múltiplas formas de pensar a simbologia dos quatro cavaleiros e respectivos cavalos que surgem no Apocalipse de João. Os símbolos são verdadeiros depósitos de sentido, permitindo encontrar neles significações contraditórias. A lógica que os rege, se de lógica podemos falar, não se coaduna com a interdição da contradição e com o terceiro excluído. No símbolo, identidade e contradição coabitam e o terceiro está incluído. Podemos ver nesses símbolos do texto de João a profecia de terríveis desgraças, mas não será desapropriado de compreender neles uma indicação do caminho espiritual, marcos na viagem do viandante que procura aquilo que por ele chama, aquilo que, numa outra linguagem, se poderá dizer o caminho da vida feliz. 

quinta-feira, 11 de dezembro de 2014

Rasgar a penumbra

Lyonel Feininger - Calle en penumbras

Rasgar a penumbra para que a luz venha, não de súbito, mas lentamente, à medida que se avança no caminho e que os olhos vão suportando novas e mais intensas claridades.

quinta-feira, 4 de dezembro de 2014

Inscrito na terra

JCM - Símbolos, signos e sinais (2007)

Assim como as nuvens desenham estranhos padrões nos céus, também o viandante o faz na terra. O seu caminho, se olhado de longe, perde a sensação de acaso que um espectador vê ao olhar a partir da proximidade, e deixa-se perceber como um conjunto de padrões que ele inscreve na terra.