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domingo, 9 de maio de 2021

A Sarça Ardente - 80

Jackson Pollock, White light, 1954
Deixo o silêncio cair sobre o dia,
ergo-o como uma vela
no altar.

Tudo se ilumina na tarde,
as ervas presas ao chão,
os pássaros perdidos nos céus.

Uma voz canta na planície,
entra na casa onde
o silêncio se cala feito luz e sombra.

Maio de 2021

quarta-feira, 28 de abril de 2021

A Sarça Ardente - 79

António Carneiro, sem título, 1915

A claridade vem, viaja
sobre o bosque.
Pássaro de luz,
fuga ao abismo
da noite.

O coração saúda-a.
Graça derramada
para iluminar
de súbito
a sombra da Terra.

Abril de 2021

sábado, 17 de abril de 2021

A Sarça Ardente - 78

Ianthe Ruthven, Giant Lilly Pads, Kew, 1996
O segredo dos dias de estiagem
sonha sonâmbulo
nos meus passos pela alvorada.

Murmura-me no coração
voa-me nos olhos
adormece-me na noite.

Sou o meu segredo,
enigma herdado
ao entrar no alvor do mundo.

Abril de 2021

sexta-feira, 9 de abril de 2021

A Sarça Ardente - 77

Eduardo Nery, Estrutura Ambígua, 1969
Descem pela fímbria
dos dedos,
trazem metáforas
de âmbar e fogo.
Sombras e silêncios
de uma paixão
nascida na névoa
da memória,
no fogo da sarça ao arder.

Março de 2021

quarta-feira, 31 de março de 2021

A Sarça Ardente - 76

Helena Almeida, sem título, 1972
O ténue tremer do mundo
suspende-se na pétala
de uma rosa,
na sombra da casa
onde o dia nasceu.

Como sibilas, as palavras
chegam cheias
de insinuações
e logo se desfazem
em sílabas trementes de sal.

Março de 2021

sexta-feira, 26 de março de 2021

A Sarça Ardente - 75

Jaime Burguillos, Ocaso, 1976
Oiço a sarça ao arder
e abrigo-me
no rumor do incêndio.

O sangue sussurra
na errância,
vinho ávido de vida.

Parado, sigo pela rua,
espera-me
a luz do equinócio.

Março de 2021

terça-feira, 16 de março de 2021

A Sarça Ardente - 73

Aristide Maillol, Dans l'esprit d'une fresque, 1930
O vinho fremente da tua boca
brilha na escuridão
do firmamento.

Bebo-o no copo escuro do corpo,
e fulguro na ferida
a arder no incêndio da fonte.

Março de 2021 

quinta-feira, 11 de março de 2021

A Sarça Ardente - 72

Gerhard Richter, Abstraktes Bild, 1995
O jardim no incêndio
da tarde
abre-se em aromas
de vento e água,
deixa fugir
as primeiras notas.

Uma melodia levita
na sombra
de um céu azul
sobre o sal
das dunas e o canto
agreste das gaivotas.

Março de 2021

sábado, 6 de março de 2021

A Sarça Ardente - 71

Jan Vermeer de Delft, La mujer del collar de perlas, 1664
Conto as pérolas no colar
feito de frio e fogo,
deixo ecoar
na sombra do coração
o incenso do Inverno.

Uma cintilação toca-te
os dedos e a luz
vinda das estrelas
reverbera no rumor
das pérolas do teu nome.

Fevereiro de 2021

 

segunda-feira, 1 de março de 2021

A Sarça Ardente - 70

Ruy Leitão, sem título
Dessa poeira que sou
guardo um resto
em saco de sisal.

Vigio-a como se vigia
um tesouro
ou a costa ameaçada

por inimigo irascível.
Nos dias luminosos
oculto-a esquecido

da ondulação dos céus
onde Deus sorri
na sombra do silêncio.

Fevereiro de 2021

quarta-feira, 24 de fevereiro de 2021

A Sarça Ardente - 69

Emil Nolde, Prophet, 1912
Olho para Oriente,
a luz da manhã
rumoreja, toca
a copa das árvores,
a casa do coração.

A voz de um profeta
macerada no musgo
fere o futuro
como se lacerasse
o ventre da mãe.

Fevereiro de 2021
 

sexta-feira, 19 de fevereiro de 2021

A Sarça Ardente - 68

Paul Klee, Early Morning in Ro, 1925
Descalços, os pés
rasgam a areia.
Semeiam sulcos
para que os sigas
e no frágil fulgor
da aurora
inundes de luz
o sal destas mãos.

Fevereiro de 2021

 

domingo, 14 de fevereiro de 2021

A Sarça Ardente - 67

Manuel Ángeles Ortiz, Albaicín, 1956
Deixo o tempo flutuar e olho
o lento florir da rosa,
a pétala afastando-se
do coração,
à espera que outra a siga

como uma sombra acompanha
o demorado viajante
ao atravessar a vida
sem urgência para chegar ou

partir, sem bagagem
a sombrear-lhe o corpo
sem a perturbação trazida
pelo destilar do movimento
na escarpa do mundo.

Fevereiro de 2021

terça-feira, 9 de fevereiro de 2021

A Sarça Ardente - 66

Jorge Barradas, sem título, 1918
A sílaba que te floresce
na boca ateia-se
no fogo da palavra,
no incêndio da frase,
na sarça ardente,
onde cintila
o orvalho dos teus lábios
para salvação dos meus.

Fevereiro de 2021

quinta-feira, 4 de fevereiro de 2021

A Sarça Ardente - 65

Fernando Lerín, Sin título, 1985
Um prelúdio no clarão do amanhecer.
Os olhos inclinam-se para longe,
esperam a chegada do Outono
com os seus deuses de folhas mortas.

Vagaroso, soletro as letras do alfabeto,
componho palavras para as escrever
em farrapos de papel que deixarei
levedar na transparência do dia.

Dobrado sobre a véspera do que virá,
oiço o fluir dos murmúrios da rua,
o rastejar do desejo na sombra
do fogo vindo da várzea do vento.

Janeiro de 2021

sábado, 30 de janeiro de 2021

A Sarça Ardente - 64

Pier Luigi Lavagnino, Collina, 1954
Fogo sobre as falésias, um cântico
de pedra no rumor
da montanha.

A floresta ergue-se num manto
de verde e sombra
onde poisam os pássaros do Sul.

Uma palavra escapa-me dos lábios
e ecoa no vazio do vale,
na sonâmbula claridade do céu.

Janeiro de 2021

 

segunda-feira, 25 de janeiro de 2021

A Sarça Ardente - 63

Maxfield Parrish, Winter Sunrise, 1949
O frio trazido pelas aves
da madrugada
cai sobre o rumor dos campos.

A luz anuncia-se e solene
cobre os cumes
abertos ao mistério do dia.

Na volúpia do acordar
abro os braços
e ato-os ao êxtase da aurora.

Janeiro de 2021

quarta-feira, 20 de janeiro de 2021

A Sarça Ardente - 62

Claude Monet, Road to Louveciennes, Melting Snow, Sunset, 1870
O silêncio vem no alvoroço
do crepúsculo, nos ramos
das tílias,
na luminosa humidade
da relva a sangrar pela cidade.

Anjos de cetim pisam sombras,
se a tarde se inclina
para a mudez
nacarada das tuas mãos
erguidas na imensidão do poente.

Janeiro de 2021

 

sexta-feira, 15 de janeiro de 2021

A Sarça Ardente - 61

Jorge Barradas, Casario – Barquinha, 1922
Havia palavras como cântaros
e infusas, uma laranjeira
perdida no centro do quintal,
pequenos caminhos de tijolo,
um poço onde se escondiam
tesouros e mouras encantadas,
a água escura na luz da tarde.
Os dias nasciam e declinavam
ao som do bronze dos sinos
e todos os meus desejos
levitavam no lume da inocência.

Dezembro de 2020

 

domingo, 10 de janeiro de 2021

A Sarça Ardente - 60

Max Ernst, El bosque embalsamado, 1933
O bosque de cedros e ciprestes
fecha-se no silvo do silêncio,
uma vidraça de verde
sob a inclemência das chuvas.

Uma mulher atravessa a praça,
leva o enxoval da vida
preso num saco de compras,
entra no limbo da lavandaria.

A vida saltita como uma rã perdida
nas águas paradas do charco,
coaxa no tumulto da tarde
e espera no enigma do calendário.

Dezembro de 2020