sábado, 10 de março de 2012

Poemas do Viandante (249)

Pissarro - Boulevard de Montmartre

249. PISSARRO, BOULEVARD DE MONTMARTRE

luz noite a traz 
incenso para o céu
cai sobre a terra
abre cavernas 
escuridão na avenida

e tu passas
rasto de fulgor
árvore sem ramos
presa na luz -
sombra pura e delida


sexta-feira, 9 de março de 2012

Meditação

Caravaggio - S. Jerónimo em meditação

A meditação é muitas vezes compreendida como rememoração e retorno a si. Mas se ela for apenas isto, não passará de mero solipsismo mesclado com o mais puro exercício narcísico. Voltar a si, à sua interioridade, não é voltar-se para um espelho onde o ego se contempla a si e se compraz nessa contemplação. Meditar é, fundamentalmente, perder-se não em si mas de si. Este perder-se é um mergulhar no vazio e, ao mesmo tempo, um tornar-se vazio, para que algo que nos transcende absolutamente possa vir e demorar-se aí como se estivesse em sua casa. Meditar é tornar vazia a casa do Senhor. Mas meditar é também um ir e estar no mundo, uma presença constante onde se dá testemunho dessa Outra presença que nos permite estar presentes. Medito ao escrever isto, medito quando faço um poema, medito quando falo com alguém ou caminho na rua, medito nas grandes acções e nos pequenos actos. Talvez a meditação não seja algo que nós fazemos, mas o modo como habitamos neste mundo, o modo como existimos. Meditar é a própria essência da existência humana.

quinta-feira, 8 de março de 2012

Poemas do Viandante (248)

Manet - The Garden at Bellevue

248. MANET, THE GARDEN AT BELLEVUE

árvore pura sem sombra
eixo do mundo
onde o teu corpo 
volteia gira rodopia
na turbulência 
deste olhar

imóvel esperas o vento
e a cada folha que cai
acendem-se na casa 
musgos e sedas
uma fogueira -
desejo a arder
no centro do furacão

quarta-feira, 7 de março de 2012

Haikai do Viandante (53)


Velho paraíso,
guardo-te entre as coisas
de que mais preciso.

terça-feira, 6 de março de 2012

Haikai do Viandante (52)


das ondas suspenso,
nem barco nem caravela,
na morte me penso.

domingo, 4 de março de 2012

Poemas do Viandante (247)

Monet - Veneza

247. MONET, VENEZA

a cidade 
um incêndio
restos de argila
e calcário
cenário de papel 
e seda a arder 
na voragem
da água

Haikai do Viandante (51)


Um traço sombrio,
árvores, folhas, promessas
de luz e um rio.

sábado, 3 de março de 2012

Poemas do Viandante (246)

Cézanne - Gardanne

246. CÉZANNE, GARDANNE

havia um segredo
no segredo
daquelas casas
uma palavra por dizer
a flor bravia
e solitária
com que partias
se me vinhas ver

sexta-feira, 2 de março de 2012

Poemas do Viandante (245)

Renoir, Boating on the Seine

245. RENOIR, BOATING ON THE SEINE

caminho pela margem
e nas águas sei
a cor dos teus olhos
ao abrirem-se para os meus

barco incendiado
a tarde chega
invade o rio 
ilumina-te 
com o cálice de luz

tudo em ti treme
mãos ansiosas
coração inquieto
a boca incerta
na vastidão das horas

quinta-feira, 1 de março de 2012

Haikai do Viandante (50)


o fim da jornada
começa quando o dia nasce
pela madrugada